sexta-feira, 16 de novembro de 2007

APRESENTAÇÃO

Em memória de Don‘Ana, minha mãe, sua docilidade e bondade de boa analfabeta.

Para Cosme Theodoro, meu pai, homem culto, que me contou tantas estórias de assombrações, cangaceiros, secas medonhas, almas penadas, botijões de ouro, mulas-sem-cabeça e onça “montó”.

Ainda para meus irmãos: Adelina, Sigismundo, Juvenal, Otocar e Jacinta.

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Copyright © 2002 by Aristides Theodoro


Digitação e projeto gráfico:

Francisco Tânio de Oliveira


Revisão:

Judith Vilas Boas Ribeiro


Prefácio:

Dimas Macedo

Foto da Última Capa:

Odete Thomaz da Silva

Posfácio: Iracema M. Régis

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Quando li seu livro, ocorreu-me o mesmo fato que você descreve no início: Um desfile de insetos e mamíferos povoou minha memória de leitora. Creio que a experiência se repetirá com tantos outros leitores. Portanto, você conseguiu seu intento. Valeu a pena!

Judith Vilas Boas Ribeiro

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Disse também Deus: Povoem-se as águas de enxames de seres viventes; e voem as aves sobre a terra, sobe o firmamento dos céus.

Criou, pois, Deus os grandes animais marinhos e todos os seres viventes que rastejam, os quais povoavam as águas, segundo as suas espécies; e todas as aves, segundo as suas espécies. E viu Deus que isso era bom. E Deus os abençoou, dizendo: Sede fecundos,

multiplicai-vos e enchei as águas dos mares, e, na terra, se multipliquem as aves.

Primeiro livro de Moisés - Gênesis, 1 versículos 20 e 22

PREFÁCIO

A permanência da obra literária e o ponto de vista da crítica centram-se no poder de imaginação que a leitura provoca. É, assim, a estética da recepção o braço armado com que a escritura postula suas investidas e os seus mais dourados arremessos.

A descoberta tardia ou o revigoramento de um escritor de talento dependem, na maioria dos casos, dos olhares subseqüentes com que certas obras são examinadas. Não é a escritura, tão-somente, aquilo que empresta leveza à obra de arte literária. Mas é a argúcia do crítico, com acerto, o elemento que ilumina a claridade do texto e o recorte estético que, às vezes, lhe é correlato.

Os Bichos na Literatura Mundial (Mauá/SP, Edições Jahde, 2002), de autoria de Aristides Theodoro, constitui um esforço inequívoco de quem sabe sondar a arte literária e os seus mais intricados labirintos, pela ótica da lucidez e da erudição.

Não se trata de livro didático, que se preste talvez à retórica das Universidades, ou ao displante vazio dos melhores chás acadêmicos. Trata-se de um esboço, apenas, de uma trajetória cultural entre livros, feita, às vezes, de forma quase apaixonada, porém sempre pela ótica de um leitor contumaz e muito atencioso.

E se reafirmo a dimensão cultural e humana deste livro de Aristides Theodoro, é porque sei que os bichos e os seus engenhos nada mais são do que a projeção dos recessos da alma e das suas formas mais silenciosas.

Se Buda falou ao espírito das árvores e reencarnou a sua seiva viva e palpitante, e se Francisco de Assis, com sua sutileza de santo e de poeta, conseguiu a audiência dos peixes e dos pássaros, é porque esses reinos pertencem igualmente ao homem e são indiscutivelmente a sua completude.

As pradarias e os mais belos cavalos do mundo, o corvo impertinente de Poe, o galo de ouro de Rachel de Queiroz, a vaca de nariz sutil de Campos de Carvalho, a baleia misteriosa de Herman Melville, Guimarães Rosa e o seu poético burrinho pedrês e a origem, também, das espécies e de toda a fauna imaginária e real dos grandes escritores estão neste livro de Aristides Theodoro a nos desafiar.

Mergulhar na sua leitura é sorver a literatura universal nas suas fontes mais originais. É, antes de tudo, enriquecer os velhos moinhos da memória. É desfrutar, por igual, o labirinto do Jardim do Éden, e o zoológico da imaginação do encanto, antes que a cegueira se faça à negação de todas as belezas.

Fortaleza, 23 de Outubro de 2001
Dimas Macedo

CAPITULO I - "MOBY DICK”

É de admirar a grande quantidade de animais que povoam a literatura do mundo todo. Não digo só a grande literatura, mas sim, a literatura em geral.

Sou um daqueles homens que não sei pensar em dinheiro (vício do homem moderno), mulheres, de maneira desabonadora, etc. Só sei pensar em artes, livros, autores, enredos e por aí afora. Dia desses, no meio da noite, acordei com a cabeça cheia de bichos da literatura, que, mesmo me marcando profundamente, quando os vi pela primeira vez, por ocasião da leitura dos seus livros, muitos foram por mim esquecidos e nessa referida noite, como num conciliábulo animalesco, se reuniram para me perseguirem e não me deixaram em paz, enquanto não voei da cama e comecei a falar deles e de seus criadores.

Duvido muito que o mais frio e calculista dos viventes, nascido de mulher, não se impressione vivamente com a fúria selvagem, os gritos e a força descomunal de Moby Dick, a imensa, a desmedida baleia branca, tão bem descrita por Herman Melville. Nesse livro, aprendemos tudo sobre o soberbo cetáceo, tudo sobre a tormenta dos mares-oceanos e tudo sobre a estupidez humana. Duvido de que o vivente leia “Moby Dick” e não saia dele totalmente lambuzado de alga, salsugem e queimado pelos sóis, ventos e gelosidades dos mares. Quando a gente sai desse livro, tem a sensação de ouvir, sempre ao longe, os silvos imensos da baleia ferida; carregando na cacunda os ganchos infernais do arpão assassino do Capitão Acab.

O nosso mineiríssimo João Guimarães Rosa fala sempre de bichos em suas obras, e poucos deles nos marcam tanto a sensibilidade, como a cascavel do conto “Bicho Mau”, de “Estas Estórias” e o “Burrinho Pedrês”, de “Sagarana”, ambos, movimentantes, nas páginas do grande narrador.

Tolstói, com maestria, descreve no seu “Os Cossacos” a presença constante do urso pardo nos campos gelados do Cáucaso, sempre perseguindo os cortiços de abelhas dos campônios montanheses. É por demais conhecido de todos o grasnido infernal e enjoativo do corvo de Edgar Allan Poe, que diz sempre a mesma frase monótona, empoleirado na cabeça de uma alva estátua de Minerva:

- “Nunca mais! Nunca mais!...”

O também norte-americano William Faulkner muito contribuiu com uma quantidade enorme de animais para a literatura. É inesquecível a constante presença de uma mula, no desenrolar de uma narrativa criminosa, contada na novela “O Mundo não perdoa”, ou o urso do livro “Desça, Moysés”.

Em um dos seus poemas, Jorge de Lima diz o seguinte: “O sagüim de Iaiá dorme num coco” e mais adiante, no mesmo poema “A Madorna de Iaiá”, o grande vate alagoano, ainda falando de bichos, assim se expressa: “Muito longe uma peitica faz Si-dó...Si-dó!...” Ascenso Ferreira, no seu estilo jocoso, deu sua contribuição no belo poema “Ascensão de São Pedro”: “Seu vigário! Está aqui uma galinha gorda, que eu trouxe pro mártir São Sebastião. Está falando com ele! Está falando com ele!” O romancista paraibano, José Lins do Rego, tem obsessão pelo canário da terra. Gilberto Freyre fez longas e belas descrições a respeito da cabra, do cavalo, do cão e da vaca. Euclides da Cunha muito elogiou a mula, no desempenho da selvagem guerra de Canudos. José Mauro de Vasconcelos descreve com beleza ímpar a formosura de alguns pássaros de nossa terra, em especial, os flamingos e jaburus. Mário Palmério, em “Vila dos Confins”, descreve uma caçada de onça, que se torna uma das partes mais interessantes para os leitores do romance. Cassiano Ricardo tinha predileção pelo jaguar das nossas matas. Castro Alves, além de outros animais, gostava também do jaguar e da juriti, a qual descreve em sentidos versos: “A juriti do taquaral no ramo, povoa soluçando a solidão”.

As novelas e contos de Ernest Hemingway estão saturadas de miúras, cavalos, trutas, perdizes, faisões, elefantes, alces, leões, patos selvagens, espadartes, tubarões e outros bichos. É sabida a fascinação de Jorge Luis Borges pelos tigres e Julio Cortázar pelos gatos. É por demais conhecido o conto do guatemalteco Miguel Ângel Astúrias, intitulado “Torutombo”, em que o velho Prêmio Nobel descreve como ninguém a fúria de um touro selvagem. No livro “Sangue e Areia”, do espanhol Vicente Blasco Ibañez cuida o tempo todo de touradas, bois, toureiros, cavalos e mulheres bonitas. O uruguaio Horácio Quiroga, no livro “Anaconda”, descreve o terrível das nossas selvas, cheias de mistérios, animais fantasmagóricos e todo tipo de assombrações criadas pelo imaginário popular. “A Divina Comédia”, de Dante, começa com uma loba e um leão. A cachorra Baleia, de “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, se tornou tão famosa como o seu criador e hoje corre mundo e uiva em diversas línguas do planeta.

O inseto estranho, de “A Metamorfose”, de Kafka, se tornou tão popular, que o povo se encarregou de transformá-lo em uma barata. O romancista baiano, Jorge Medauar, tem uma novela que se chama “A Procissão e os Porcos”. O velho folclorista pernambucano, Mário Souto Maior, em “Os Mistérios do Faz Mal”, apresenta uma lista enorme com os nomes dos animais que o Criador anunciou a Moisés, dizendo o que servia e o que não servia para a alimentação do povo de Deus. Lawrence da Arábia enfatiza sempre o valor do camelo nos seus “Os Pilares da Sabedoria”. O boi e o cavalo são sempre citados nos romances de Erico Verissimo. Dionélio Machado escreveu uma novela intitulada “Os Ratos”. A paulista Lígya Fagundes Telles, “O Seminário dos Ratos”. Em “A Peste”, do francês Albert Camus, os ratos invadem e passeiam livremente pelas ruas de uma cidade. Em uma das novelas menores de Balzac, é descrita a convivência amigável de um homem com um tigre, o mesmo acontecendo no conto “Meu Tio Iauaretê” do livro “Estas Estórias”, de Guimarães Rosa.

O grande Jorge Amado, no capítulo “A Mata”, do seu inconfundível “Terras do Sem Fim” (para mim o livro mais poético do autor), descreve uma infinidade de animais como as andorinhas, corujões, macacos, “cobras de inúmeras espécies que deslizavam entre as folhas secas, sem fazer ruídos, onças miavam seus espantosos miados nas noites de cio”. No mesmo capítulo, o Jorge Amado ainda cita o lobisomem, a caapora, a mula-de-padre, o boitatá, o lobo e tantos outros seres imaginários. O jornalista Nelson Rodrigues tinha obsessão pelas “cabras vadias”.

CAPITULO II - “OS PATOS”

O torturado poeta Gonçalves Dias, quando longe da pátria estremecida, escreveu estes versos doridos, que todo brasileiro sabe de cor: “Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá, as aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá”. “Desmamar bezerro não é nada, duro é desfilhar a mãe” – disse Chico Buarque de Holanda, em “A Fazenda Modelo”. O novelista Dias Gomes, no livro “Sucupira Ame-a ou Deixe”, sucesso de audiência no passado, diz o seguinte: “Negrinho do Jegue, embriagado, apoia-se no jumento para não cair”. “As aves de ouro vão nas árvores pousar, / Os meus peixes de ouro a mim irão voltar”, - disse o romancista inglês, católico, Chesterton em “O Homem de Duas Barbas”. É notório o magrém do cavalo Rocinante, da novela “Dom Quixote”, de Cervantes. “Quantos animais restam? Reuniu os restos do seu rebanho. Nessa noite abriu, com um par de alicates, o arame da pastagem. Suas ovelhas pastavam toda noite”. (Do livro “Bom Dia para os Defuntos”, do peruano Manuel Scorza). Vargas Llosa escreveu “La Ciudade y Los Perros”. O paraibano José Américo de Almeida intitulou um dos seus livros de “Reflexões de Uma Cabra”. O grande cearense, Pompílio Diniz, no seu “Poemas”, tem uns versos assim: “Eu tenho na minha casa/ Um papagaio faladô, / Bichinho de pena e asas,/ Num pode tê mais valô... Conversa cum´s animá/ E, adespois, vem me contá/ Tudo qui os bicho falô!” O valente Prêmio Nobel russo, Aleksandr Soljenitsin, para melhor denunciar os arbítrios do falido comunismo soviético, escreveu um belo livro intitulado “O Carvalho e o Bezerro”. Outro russo, Anton Tchekhov, escreveu uma história curta, que se chama “Camaleão”. O nosso monumental e tempestuoso Tobias Barreto de Menezes, assim começa o poema “Os Tabaréus”: “Ouve como um tropel,/ Que se aumenta, que se engrossa.../ A poucos passos da choça/ Nitriu fogoso corcel.” O velho poeta pernambucano, Solano Trindade, fez esta pergunta nos “Cantares a Meu Povo”: “Quem tá gemendo/ Negro ou carro de boi?”. O Prêmio Nobel indiano, de 1913, Rabindranath Tagore, no livro de título estranho, “Çaturanga” (escreve-se com ç mesmo), diz o seguinte: “Estaria disposto a fazer passar como caril de cabrito os pratos de aves”. O aristocrático poeta da Paulicéia, Guilherme de Almeida, no seu imenso poema “Raça”, diz: “Chimpanzés mecânicos, treparam na cruz com rezas, trejeitos e benzeduras”. O sarrista Juó Bananére, em “La Divina Increnca”, com seu italiano deturpado, assim escreveu: “Deitava sempre di notti,/ I alivantava cidigno/ Uguali d’um passarigno, Alegro i cuntento da vitta”. O russo rebelde, Maiakóvski, comenta no seu “Hino ao Juiz”: “Por um Peru-Paraíso clamam os peruanos/Onde havia mulheres, pássaros, danças”. O humorista russo, Arcádio Avertchenko, escreveu um conto intitulado “Uma Vaca”. Platero é o nome de um burrinho peludo, criado pelo espanhol Juan Ramón Jiménez, ganhador do Prêmio Nobel, em 1956.

Homens e Caranguejos” é título de um romance de Josué de Castro. “Tem uns camaradas que não acreditam em Deus; vão para o Jóquei, estudam o programa e passam a acreditar piamente nas patas de um cavalo”. – Stanislaw Ponte Preta em “Máximas Inéditas de Tia Zulmira”. O escritor catarinense Othon d’Eça é autor de um conto intitulado “O Pica-Pau”. O botânico francês, Auguste de Saint Hilaire, que viveu no Brasil, de 1816 a 1822, tem uma descrição que se chama “Em lombo de Burro”. O inglês Lafcadio Hearn escreveu um conto que se intitula “O Menino que Desenhava Gatos”. O gaúcho Moacyr Scliar novelou com “O Carnaval dos Animais”, em 1986. O romancista Marques Rebelo, no “A Mudança”, diz: “tenham a coragem de proceder à extirpação do berne, à cauterização da bicheira”. O extraordinário contista cearense, Juarez Barroso, (morto imaturamente), no livro genial, “Joaquinho Gato”, inclui um conto que se intitula “Cururu”. O contista piauiense, radicado em Santo André, Valdecirio Teles Veras, no bem urdido livro “Sabor Canjica e Outras Estripulias”, editado pela Alpharrabio, diz, narrando suas reminiscências sertanejas: “Saímos do curral e o carneiro, sem que necessitasse de corda, me acompanhou como se fosse meu velho conhecido, me seguindo como um cão fiel”. O cínico e desbocado poeta português, Manuel Maria du Bocage (1750-1795), em um dos sonetos, poetisa: “O corvo grasnador e o mocho feio, / O sapo berrador e a rã molesta / São meus únicos sócios, na floresta”. Domingos Carvalho da Silva, da Geração de 45, tem um livro que se intitula “A Presença do Condor”. O poeta mauaense, Aristides Castelo Hanssen, no sonoro “Canção Pro Sol Voltar”, publicado em1983, num dos momentos difíceis deste País, escreveu: “É noite, os gatos são pardos”.

A poeta e intelectual argentina, Margarita Anechina, no livro “Das Profundas Raízes”, escreveu: “Deixou-me um pássaro ferido...” Roque Luzzi, tão cedo roubado do nosso convívio, em “A Festa dos Meus Olhos”, no poema “Ter Asas e Voar”, exclamou “: Oh! Ter asas e voar, / voar, voar pela amplidão”. Oliveira Ribeiro Neto, no “Eu Canto a América”, apresenta-nos estes versos: “da moura Granada / nutrido das forças das cabras ciganas, / no pico dos Andes em busca dos índios / é como um índio, / mantido de erva e leite de lhama”. A poeta rebelde, Tônia Ferr, no livro “Massacre”, diz: “quero ser lobo em alcatéia / ou camundongo a me esconder”. Paulo Setúbal, num poema sertanejo, “Alma Cabocla”, escreveu: “no eito, / Vão desbastando os juás. / Eu venho tão satisfeito. / Como se houvesse em meu peito / - Um baile de tangarás!” Outro paulista, Menotti Del Picchia, começa o seu imenso “Juca Mulato”, assim: “Nuvens voam pelo ar como bando de garças”. O conhecidíssimo José Paulo Paes, um dos mais criteriosos tradutores do país, assim aparece em “A Poesia Está Morta Mas Juro Que Não Fui Eu”: “mais vale um pássaro na mão / que uma espingarda. / O poeta Oswaldo de Camargo, em “O Estranho”, tem um verso assim: “como ave / de volta ao seu ramo verde”.

O poeta Henrique Cunha Jr., nos “Cadernos Negros 20, colaborou com um conto intitulado “O Olho Azul do Cachorro”. O satírico Cláudio Feldman escrevendo “Cais do Caos”, colocou: “Desvenda / A centopéia”. O romancista Antonio Possidonio Sampaio, no seu mais recente livro, “Andanças na Contramão”, argumenta: “Ali pardais, chupins, tico-ticos e rolinhas convivem pacificamente ao lado de carros e advogados apressados”. Alexandre Takara diz nas suas reminiscências filosóficas, “O Semeador de Lembranças”: “A natureza desperta, as folhas das árvores farfalham ao sopro do vento. O galo canta, o boi muge, o vaqueiro toca o berrante, os pássaros ruflam suas asas. Conheço-os pelo canto”. A panfletária americana, Harriet Beecher Stowe, autora do famoso “A Cabana do Pai Tomás”, (livro que levou Lincoln a dizer: “Ele (o livro), mais do que os generais cooperaram para a vitória das forças do Norte”), - disse assim: “Na água, límpida como cristal, nadavam milhares de peixinhos, de variadas cores, brilhando como tantas outras pedras preciosas. O verborrágico Coelho Neto, num dos contos de “Sertão”, começa dizendo: “o gado mugia, extenuado e magro, levantando para o céu fulvo os grandes olhos mansos e resignados”. O escritor e musicólogo andreense, Wagner Calmon, na crônica “Porta Sem Trinco Baú sem Tranca”, rememorando o tempo de menino do interior, diz: “vi um vaga-lume no quintal”

CAPITULO III - “A VACA DE NARIZ SUTIL”

A romancista cearense Rachel de Queiroz tem dois livros com nomes de bichos: “O Caçador de Tatu” e “O Galo de Ouro”. “Ninho de Cobra” é título de uma novela de Ledo Ivo, que começa com uma raposa invadindo a cidade. José Cândido de Carvalho criou o seu “O Coronel e o Lobisomem”, que hoje correm mundo em noites de lua cheia. Chico Anysio escreveu “O Batizado da Vaca”. Julieta Godoy Moreira é autora de “Entre Lobos e Cão”. Marisa Raja Gabaglia criou o seu “Milho para Galinha, Mariquinha”; o pernambucaníssimo Luís Jardim escreveu uma novelota infanto-juvenil, que se chama “O Boi Aruá”. Lima Barreto, um dos escritores necessário a este país, descreve de maneira magistral, no seu “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, um feroz ataque de formigas a um pomar. “Três Alqueires e uma Vaca” é título de um livro do escritor católico, Gustavo Corção. A velha cronista paraense, Eneida, publicou em 1955, pela José Olympio Editora, o seu “O Cão da Madrugada”. O romancista Osório Alves Castro, barranqueiro do São Francisco, intitulou o seu segundo livro com o sugestivo nome de “Maria Fecha a Porta Prau Boi Não te Pegar”. “Carcará” é nome de uma novela do potiguar Ivan Bichara. O grande Monteiro Lobato, esse homem imenso, que fez as crianças do Brasil se interessarem por livros, intitulou uma de suas obras de “Picapau Amarelo”. O goiano Campos de Carvalho escreveu “A Vaca de Nariz Sutil”, Francisco Marinho, da Academia Paulista de Letras, criou várias histórias com nomes de bichos: “O Coleira Preta”, “Gafanhotos em Taquara-Póca e “Bugre-do-Chapéu de Anta”.

São por demais conhecidos os belos versos de Manuel Bandeira, em que os batráquios dialogam na lagoa: - “Urra o sapo boi! – Meu pai foi rei” – Foi! – Não foi” / Foi – Não Foi!”

O alemão Günter Grass, Prêmio Nobel de Literatura de 1999, escreveu “A Ratazana” e o “Linguado”. O polêmico D. H. Lawrence publicou o “Pavão Branco” e “A Serpente Emplumada”. Machado de Assis, no seu estilo trôpego, monótono, repetitivo, abre o “Memórias Póstumas de Brás Cubas” com a seguinte frase: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver”. De Mário de Andrade é “Empalhador de Passarinho” e o “O Peru de Natal”. Paulo Dantas, esse velho escritor “nordestinado”, muito contribuiu para o povoamento do zoológico literário, com “O Sertão do Boi Santo” e “De Repente o Mar”, neste o, personagem central é uma baleia. O grande mexicano Carlos Fuentes intitulou uma novela de “A Cabeça da Hidra”; o nosso pernambucano Hermilo Borba Filho, autor de um estilo seguro, incisivo, criou “O Cavalo da Noite”. A Editora Paz e Terra publicou, em 1978, a novela do peruano Ciro Alegria, que tem o belo título em castelhano, de “Los Perros Hambrientos” (Cães Famintos). “Três Tristes Tigres” é o clássico do dissidente cubano, Cabrera Infante. Severo Sardui foi outro cubano, que também botou uma “Cobra” no zoológico literário. O inconfundível Juan Rulfo, no “O Planalto em Chamas”, publicou um conto intitulado “Não está Ouvindo os Cachorros Latirem?”. O escritor dominicano, Juan Bosch, no seu “Maravilha”, escreveu: “calmo, lúgubre, experimentado em sofrimento, ia caminhando lentamente o velho boi negro”. O argentino Ricardo Güiraldes, no seu fascinante “Dom Segundo Sombra”, cita com assiduidade cavalos, cães, vacas, quero-queros e “um galo cantou; alvorecia impetuosamente”. “Entardecia quando a cavalgada chegou” – disse o equatoriano Jorge Icasa, em seu valoroso romance social, “Huasipungo”. O nosso Visconde de Taunay, no soberbo “A Retirada da Laguna” (com nova edição na praça), fala o tempo todo em bois e cavalos. Aníbal Machado assinou um conto que se intitula “Ratos, o Guarda-Civil e o Transatlântico”. A Edições Melhoramentos, na Coleção Prisma, publicou “Os Animais em Perigo”, do norte-americano John Sparks. “Bichos que falam” é título de um infanto-juvenil de Viriato Correia. O casal de escritores norte-americanos, Barbara “BJ” Hateley e Warren H. Schmidt, escreveram um livro sobre negócios, com o título de “Um Pavão na Terra dos Pingüins”. O vate paulista Rolando Roque da Silva, em “O Poeta e Circunstância”, diz o seguinte: - “é chegado o tempo em que as ovelhas, / retribuindo os golpes e os ápodos / estão, nos quatro cantos do Universo, / arreganhando os dentes para os lobos”. Antonio Lapate Netto, poeta e educador competente, em Santo André, em “Alhos com Bugalhos”, cita vários animais como o lobo, o bode, o leão, o grou, o elefante, a cigarra, a formiga, a mosca, a aranha, a raposa, o galo, a mula, o canguru, o pernilongo, entre outros.

O velho poeta piauiense, Da Costa e Silva, um dos grandes trovadores deste país, infelizmente esquecido, no seu poema mais conhecido, “Saudade”, do livro “Poesias Completas”, assim diz: “Saudade! O Parnaíba – velho monge. As barbas brancas alongando... E, ao longe, / o mugido dos bois da minha terra”. A parisiense Anaïs Nin, que provocou paixões desesperadas no tarado Henry Miller, escreveu um belo livro, com o título de “Pequenos Pássaros”.

Em 1973, um grupo de rapazes e moças sonhadores, no meio dos quais se encontrava este que vos fala, fundou o Colégio Brasileiro de Poetas, em Mauá (SP) e ao publicarem a segunda antologia poética do grupo, deram-lhe o nome de “Revoada de Pássaros Negros”. O romancista americano, Scott Fitzgerald, no “Seis Contos da Era do Jazz”, tem um trabalho intitulado “As Costas do Camelo”. John Steinbeck criou “Ratos e Homens” e “O Menino e o Alazão”. Jack London, em boa parte dos seus livros, tem animais como personagens, tais como “O Filho do Lobo”, “O Lobo do Mar”, “As Tartarugas da Tesman”, etc. O Prêmio Nobel, García Márquez, enriqueceu a literatura mundial com “Olhos de Cão Azul”; o chileno José Donoso nos presenteou com um livro intitulado “O Obscuro Pássaro da Noite”. Walt Whitman, o velho gato angorá norte-americano, assim descreve no seu “As Folhas da Relva” “o rapazola carpindo milho, o liteireiro guiando seus seis / cavalos no meio da multidão”. O nosso importantíssimo Raul Bopp, que escreveu “Cobra Norato” e tem quem diga que é “Cobra no Rato”, começa o imenso poema assim: “faço puçanga de flor de tajá de lagoa / e mando chamar a Cobra Norato”.

O contista catarinense, Enéas Athanázio, em um de seus livros, descreve um velho cavalo (Rosilho Velho) com tanta perfeição e sentimento, que provoca choro no leitor.

CAPITULO IV - “O CORVO”

O filósofo francês Jean-Paul Sartre intitulou uma de suas peças de “As Moscas”; o recifense Frederico Pernambucano de Mello, no “A Guerra Total de Canudos”, diz o seguinte, referindo-se à alimentação do homem do Nordeste do país: “Como o mocó, o punaré ou o preá, fregueses dos serrotes de pedra, abria-se sempre uma fonte adicional de proteína para os residentes mais escopeteiros, do lado das rolinhas, da lambu, da codorna e das aves de arribação”. Mais adiante, no mesmo capítulo, o grande ensaísta ainda diz: “As forças armadas rendem-se ao segredo alimentar dos jagunços, cangaceiros, matadores de onça, amansadores de burro brabo, tropeiros e de quantos desenvolvem ainda hoje atividades intensas nos sertões do Nordeste”. Yolanda Földes escreveu “A Rua do Gato que Pesca”; o americano Horace McCoy publicou “Os Cavalos Também se Abatem”; Jean Carrière deleitou seus leitores com “O Gavião Louco”; A.S. Györgi escreveu “O Macaco Louco”; “Tropas e Boiadas” é título do clássico do goiano Hugo de Carvalho; Henry Miller escreveu estas frases duras, no seu “Sexus”, primeiro volume da famosa trilogia “A Crucificação Encarnada”: “As moças estão exalando vapor, como cavalos suarentos”. Dostoievski, em um dos seus livros mais pungentes, “Humilhados e Ofendidos”, conta-nos uma estória patética, onde aparecem um velho miserável e o seu sarnento e repugnante cão Azor. Leiamos este fragmento: “Após haver permanecido três ou quatro horas sentado, o velho, por fim, levantava-se, pegava o chapéu e ia para casa. O cão levantava-se, também, e, de cauda entre as pernas e a cabeça baixa, seguia-o maquinalmente com seus passos lentos.”

De Víbora na Mão” é título de um livro do romancista Hervé Bazim. É por demais conhecido aqui no Brasil, “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell; “O Planeta dos Macacos”, de Pierre Boule, também foi muito lido entre nós. O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche, filosofou assim, a respeito do homem, no “O Antecristo”: “No nosso conceito (o homem) é o mais forte, porque é o mais astuto: a sua espiritualidade é uma conseqüência disso. Por outro lado, defende-nos contra uma vaidade que aqui também queria levantar a voz: como se o homem tivesse sido o grande pensamento último da evolução animal. Não é de modo algum a coroa da criação; cada ser encontra-se junto a ele no mesmo grau de perfeição”; mais adiante, o irado pensador germânico diz de maneira afirmativa: “o homem é, relativamente, o mais deficiente dos animais”. Os versos que se seguem encontram-se no “Primeiro Caderno do Aluno de Poesia Oswald de Andrade”: “A sua habilidade consistia em matar de longe / Decepando com uma longa e certeira faca / Cabeças de frangos, patos, marrecos, perus / enfim / Da galinhada solta no quintal”. A norte americana Alaide Malkus escreveu “A Potranca Cor de Ouro”; o padre Vieira, nosso contemporâneo nordestino, batizou o seu livro de “O Jumento Nosso Irmão”. A contista Iracema M. Régis, no trabalho intitulado “Sonhos Imortais”, inserido em “Cadernos Negros 20, diz o seguinte: “Se Deus me ajudar, volto para minha terra, ainda volto. Vendo tudo isso aqui e vou terminar meus dias ouvindo a juriti e o sabiá”.

“Os cavalos caminhavam de pescoço caído, em silêncio”, - disse o francês André Malraux em “A estrada Real”. “Deitado no peitoril da janela, o cachorro olhava a noite na praça”, de Marina Colassanti, no livro de nome estranho, “Zooilógico”. “Yo soy Toro em mi Rodeo”, de José Hernandez, em “Martín Fierro”; Pierre Louÿs assim se expressou no “O Amor de Bilitis”: “supondo que eu tivesse sido picado por um escorpião”. Emily Dickinson disse assim no seu “Uma Centena de Poemas”: O “pedigree” do mel / Não interessa à abelha”; o conhecido escritor cearense, Domingos Olímpio, em “Luzia Homem”, assim se expressou: “A pousada predileta de bandos de urubus-tinga e camirangas vorazes”. “Milkaus cavalgava molemente o cansado cavalo” em “Canaã” de Graça Aranha. “As Abelhas Farmacêuticas com Asas” é título de um livro de N.P. Ioirich. “A minha onça não era uma onça qualquer. Era uma pretona, malhada de prata, de olhos verdes, brilhantes como uma lanterna”. – “Maíra” – Darcy Ribeiro. “O gado vinha procurar água, ali embaixo tinha uma lagoa” – Antonio Torres em “Essa Terra”. O poeta paulista, Jacob Netto no livro “Palmeiras do Meu Deserto”, tem um verso assim: “No roseiral florido um colibri, / num beijo ardente cada flor abarca”. “O Conde e o Passarinho” é título do livro de crônica de Rubem Braga. O norueguês Henrik Ibsen intitulou uma de suas mais famosas peças de “O Pato Selvagem”; o pernambucano Mário Sette, no livro “Arruar – História Pitoresca do Recife”, tem um capítulo que se chama “Vai sair um Passarinho”; o poeta inglês, T.S.Eliot, em um dos seus inspirados versos disse assim: “Agora os rouxinóis cantando estão”. “Não fui ver a baleia que estava a bem dizer à porta de minha casa a morrer”, diz Clarice Lispector em “Visão do Esplendor”; o famoso James Joyce, autor de Ulisses, abre o “Retrato do Artista Quando Jovem”, assim: “Certa vez – e que linda vez que isso foi! -, vinha uma vaquinha pela estrada abaixo, fazendo muu!” “A Borboleta de Dinard” é título de um livro do Prêmio Nobel italiano, Eugenio Montale; o americano Nathanael West intitulou seu livro de “O Dia do Gafanhoto”.

O Queijo e os Vermes” dá título ao livro do historiador italiano, Guinsburg; o romancista Kurt Vonnegut Jr, disse o seguinte, no livro “Revolução do Futuro”: “A gata arqueou suas costas e unhou o terno de Paul novamente”. O nosso Amir Klink, em “Cem Dias Entre Céu e Mar”, descreve esta cena: “Um enorme tubarão lentamente se esfregava no casco, com a galha para fora da água, e com a cauda, a cada passada dava um tope na proa”. O russo rebelde Yevgeny Yevtushenko disse assim no poema “Feira em Simbirsk”: “Tudo escuro em redor... A polícia secreta pula como esquilo”. “Certa vez, uma turma de policiais com cães sabujos examinou esta floresta” – isto está no livro “Um Homem Jovem”, do escritor alemão Botho Strauss. Marcello Vérité e Romains Semon escreveram um infanto-juvenil que se chama “Banto: O Pequeno Elefante”. “Os cachorros mudaram, afinal; e quando imaginávamos que nós tínhamos de haver com uma raposa, eis que ela se transforma em texugo” – Fielding em “Tom Jones”. “Os coelhos, pobrezinhos. Havia muitos coelhos na Ilha: Brancos, cinzentos, pretos, malhados. Mas, quem mandou os coelhos procriarem tanto?” Assim o romancista Herberto Sales abre o seu romance “O Fruto do Vosso Ventre”. A Rede Globo de Televisão, novelizou “O Sorriso do Lagarto”, do baiano acadêmico, João Ubaldo Ribeiro. Todo o país ainda assovia ou gunguna, comovido, os versos bonitos de Catulo da Paixão Cearense. Dia desses, a Iracema e eu fomos jantar num restaurante do Largo do Arouche, e pudemos notar como a dupla de cantores Radiante e Fábio Luiz conseguiram despertar vivo interesse dos comensais presentes, quando abriram o peitão no mundo, cantando os versos sentidos de “O Luar do Sertão”, onde estão estas estrofes que vou transcrever na íntegra: “Ser enterrado / numa grota pequenina, onde, à tarde, / a sururina / chora a sua viuvez!” Não resisto aos encantos da poesia desse grande maranhense e transcrevo mais alguns versos de incontida beleza, do mesmo “O Luar do Sertão”. Vamos lá: “Enquanto a onça, / lá na verde capoeira, / leva uma hora/inteira, vendo a lua, / a meditar!” Fomos garimpar os versos que se seguem, no “O Tocador de Atabaque”, de Eduardo Alves da Costa: “Tropas de burro, / com seus tropeiros”. O sombrio Augusto dos Anjos, tido como o poeta cientificista do Brasil, também dá aqui a sua contribuição para o enriquecimento deste zoológico animalesco: “Que importa a mim que a bicharada roa / Todo o meu coração, depois da morte?” José Duro, poeta português, é um trovador da mesma família dos Augustos dos Anjos e autor de um livro trágico, penumbroso, chamado simplesmente “Fel”, que destila versos assim: “Quando o Coveiro, um dia, arremessar, sombrio, / O teu corpo gentil aos vermes resolutos, / De lá, da esfera azul dos astros impolutos, / Verás então, Mulher, verás como eu me rio”. O teatrólogo Luigi Pirandello, ganhador do Prêmio Nobel em 1934, intitulou alguns de seus livros com nomes de animais. Vejamos: “A Mosca”, “O Corvo de Mizarro” e “Um Cavalo na Lua”.

CAPITULO V - “ARARA VERMELHA”

O escritor Ronald de Carvalho, no livro exemplar, “Itinerário”, falando da sua visita ao México, assim escreveu, tomado de deslumbramento: “onde as árvores não brotam, não corre água, nem se emplumam aves, está o mexicano, com sua coragem, a sua resignação e o seu heroísmo espontâneo”. O carioca Gastão Cruls batizou dois contos, um “Coivara”, de “O Caçador de Pacas” e o outro de “História Puxa História”, de “A Patativa”. O mundialmente famoso Vladimir Nabokov, na novela, “Lolita”, descreve este período: “Cresci, criança saudável e feliz, num mundo brilhante de livros ilustrados, areias claras, laranjeiras, cães amigos, paisagens marinhas e rostos sorridentes”. Francisco Julião, esse pernambucano misto de escritor e agitador político, escreveu assim, em “Irmão Juazeiro”: “O defeito dela era ser estéril. O maior defeito que u’a mulher podia ter. Como vaca maninha. E por falar em vaca, quando o filho nascesse, ferrava – ferrava-lhe um garrote”. O poeta sergipano, Afonso Vicente Ferreira, no soberbo livro “Arpejos Póeticos”, escreveu: “Com unhas e dentes, um cão rói um osso”. O escritor Eduardo de Oliveira, em “Angústia do Tempo Presente”, que está no livro “Banzo”, assim se expressou: “O leite é artigo de luxo / que só o rico põe no buxo, / e dá pros gatos, e pros cães”. Bruna Lombardi intitulou um dos seus poemas de “O Dragão”, de “Ilha das Cobras”. O vigoroso contista, teatrólogo e poeta Cuti, pseudônimo de Luís Silva, em “Batuque de Tocaia”, cunhou estes versos incisivos: “Eu vou ao mar para colher os ossos / e pedir aos tubarões que devolvam a lembrança / dura dos seus banquetes". O gaúcho Vargas Neto batizou um livro de “Gado Xucro”. Boris Pasternak abre o “Dr. Jivago” assim: “Seguia, seguia sempre e, quando cessava o canto fúnebre, julgava-se ouvir, como a continuá-lo, cantarem as pernas, os cavalos e o sopro do vento”. O catarinense Alcides Buss, no seu “Transação”, inseriu os poemas “Todos os Pássaros” e “Beleza e Camarões”. Colhemos a descrição seguinte no livro “História Social da Economia Capitalista no Brasil”, do sociólogo Oliveira Viana, citando Saint Hilaire: “Umas baixas casinhas, quase sempre de palhoça eram a habitação de senhores de 20 ou 30 léguas de belas terras e que colhiam 10 a 20.000 bezerros”. O português Fernando Pessoa escreveu o famoso poema “O Guardador de Rebanhos”. Outro português, também melancólico, Antero de Quental, disse os versos seguintes: “A amazona, que se agarra às crinas / Dum corcel e combate satisfeita”. O poeta pernambucano, Deolindo Tavares, no seu “Poesia”, escreveu assim: ... “o Leão representa a besta, e a besta domina o mundo”. Camões se referindo ao avestruz, que dizem ter um intestino que devora tudo, assim se expressou no épico “Os Lusíadas”: “às aves no ventre o ferro gastam”.

C. G. Jung, nas memórias, assim descreve suas andanças pelas Áfricas negras: “Até o horizonte mais distante, percebemos imensas manadas: gazelas, antílopes, gnus, zebras, javalis, etc. Pastando e sacudindo as cabeças, as manadas se moviam lentamente - ouvia-se apenas o grito melancólico de uma ave de rapina. Havia o silêncio do eterno começo”. O poeta cearense Vanderley Pereira, em “Cantiga que Vem da Terra”, presenteia o leitor com estes belos versos: “O Cenário: a caatiga, um boi mestiço; / Um chocalho chorando, um pau quebrado; / Um cavalo cardão, sagaz; Um gibão sobre o toco, abandonado”. Outro poeta, desta vez o matuto Zépraxédi, do Rio Grande do Norte, em “Meu Siridó”, imprimiu versos como os que se seguem: “Tem a tristeza de rês / qui berra chêrando o chão / no lugar qui derramaro / o sangue dum seu irmão”. “A negra dançava sempre, circulava pela sala, derretida para os homens, roçando-se neles, num jeito de galinha contra o galo, no terreiro” – O escritor cearense Herman Lima assim escreveu no seu livro “Garimpo”. O contista baiano Luís Garboggiani Quaglia no conto “O Menino e o Peixe”, incluso em “Panorama do Conto Baiano”, disse: “o galo cantava na madrugada, a pomba gemia através do ar aveludado”. Outro baiano, Santos Moraes, publicou uma estória curta chamada “Caçador de Borboletas”. Georges Simenon intitulou dois dos seus policiais com nomes de bichos: “O Cão Amarelo” e o “Gato”. A carcaça de um veado, morto a vinte milhas, deu carne suficiente para encher uma torta de vasta circunferência. Um bacalhau de sessenta libras, pescado na baía, fora dissolvido no rico molho do “chowter” (peixe cozido com biscoito) – esta descrição-receita está no livro “A Casa das Sete Torres”, de Nathaniel Hawthorne. Até hoje ainda corre mundo, quase que de domínio público, a frase famosa do Barão de Itararé: “Quando pobre come frango, um dos dois está doente”. O poeta cearense Cruz Filho, no livro “Poemas dos Belos Dias”, tem um verso que diz o seguinte: “Aos pinchos, pela sombra, indolente e moroso, / O batráquio estacou no fundo do poço à borda”. Rudyard Kipling intitulou um de seus livros de “Jacala, O Crocodilo”.

R. L. Stevenson, no início do “A Ilha do Tesouro”, diz... “coisas esquisitas da Ilha da Tartaruga e outras regiões selvagens do continente espanhol”. Bernando Guimarães, no romance “A Escrava Isaura”, fez esta descrição: “Bois truculentos, e nédias novilhas deitadas pelo gramal, ruminavam tranquilamente à sombra de altos troncos da casa, balavam as ovelhas, e mugem as vacas”. James F. Cooper, no primeiro capítulo de “O Último dos Moicanos”, disse assim: Aceitaram a proteção do major Duncan Heyward, em belíssimos cavalos, iniciaram a caminhada”. “Se o encantado de sua vida é um pássaro maravilhoso que você ama carinhosamente, você alegremente o alimentará com as sementes do seu íntimo e fará do seu coração uma gaiola” – disse Kahilil Gibran Kahilil, no livro “Espirito Rebelde”.

CAPITULO VI - "OS CAVALOS DISPARARAM NAS PRADARIAS DO ESPAÇO”

O velho escritor paulista Afonso Schmidt, no livro “São Paulo dos Meus Amores”, tem uma crônica que começa assim: “Se os passarinhos cuidassem de linhagem e, além das árvores de rua, tivesse árvores genealógicas, o mais mofino pardal do Anhangabaú poderia brasonar de avós que vieram no My Flower, isto é, na imigração histórica de 1907”. No fim da crônica, o bom cronista, sempre falando dos frigilídios, escreveu, encerrando, estas observações: “Os pardais são alegres, comunicativos, brejeiros. Parece que andam pela rua como os outros moleques, catando pontas de cigarro. Lá vem um deles, saltitando, para mim. É um perfeito garoto. Vocês vão ver que ele anda pitando, escondido dos pais. Aposto em como vai me pedir fogo para o cigarro. E eu vou negar. Que diriam de mim as velhas beatas pardocas do meu bairro?"

O norte-americano James Baldwin, no seu “Giovani”, diz assim: “O tempo é coisa simples, é comum, é como água para um peixe”. O mineiro Haroldo Bruno, na novela infanto-juvenil, “O Misterioso Rapto de Flor-do-Sereno”, assim escreveu: “Vai-se que tinha vontade - as galinhas, os bodes, os tatus, os tamanduás – de puxar um dedo de prosa com Zé Grande”. O poeta Fernando Leal no poema “O Leão e Outros Animais”, escreveu os versos que se seguem: “Uma ovelha, uma cabra e uma novilha, trataram com um leão, fazer igual partilha. Da caça que apanhassem no sertão”. É famosíssima a fábula de La Fontaine.O Lobo e a Cegonha”. A Condessa de Ségur no mundialmente conhecido “Os Desastres de Sofia”, assim escreveu: “Sofia ia todas as manhãs ao galinheiro com a mãe. Lá existiam galinhas de diversas raças e muito bonitas. Mme de Réan havia mandado pôr uma galinha para chocar uns ovos, dos quais deveriam sair pintinhos maravilhosos”. A transcrição a seguir se encontra em “Os Três Mosqueteiros”, de Alexandre Dumas: “O que não prestava era o pangaré. Todo mundo se ria à passagem do jovem, não pelo cavaleiro, impecável de porte, mas pela cavalgadura, às vésperas da morte”. “No centro da mata virgem, olhou para cima maquinalmente; viu um enorme quatimundé, que o espiava da bifurcação de um galho, fazendo-lhe gaifonas com o longo focinho pontiagudo” é de Júlio Ribeiro, em “A Carne”. Eurico Santos deu a luz aos livros “Da Ema ao Beija-Flor”, “Pássaros do Brasil”, “Entre o Gambá e o Macaco” e “As Cobras Venenosas”, entre outros. No “O Pequeno Príncipe”, de Saint-Éxuperry, além da grandiosidade do velho pé de Baobá, da ganância do contador de estrelas: - “Três e dois são cinco. Cinco e sete, doze. Doze e três, quinze”, também chama atenção do leitor uma raposa e uma jibóia, em pleno deserto.

Marion-Zimmer Bradley no best-seller “As Brumas de Avalon”, assim começa a história: “Naquele ano, as tempestades de primavera haviam sido excepcionalmente violentas; noite e dia o rumor das ondas ressoava pelo castelo, impedindo seus habitantes de dormir, e até os cães uivavam dolorosamente”. Portugal teve um poeta, e por sinal um bom poeta, que se chamou Bulhões Pato. O trovador português, João de Deus, no livro “Campo de Flor”, tem um poema intitulado “A Águia e o Corvo”. O chileno Dom Pablo Neruda, no seu envelhecido “Canto General”, disse assim: “Os ilustres papagaios encheram as profundidades da folhagem com lingotes de ouro verde”. Ezra Pound, no cântico II do seu monumental “Os Cantos”, foi sintético: “Gaivotas, abrem as asas”. O paranaense Emílio de Menezes, numa tradução livre de “O Corvo” de Poe, saiu-se assim: “Abro a janela e vejo entrar, ruidosamente, Amplas asas batendo e ares de fidalguia. Um majestoso corvo altivo e irreverente, como arauto feral da noite erma e bravia.”

O excelente regionalista goiano, Léo Godoy Otero, dono de um estilo singular, abre “O Caminho das Boiadas”, com estes versos: “Casqueando os dois sujos em matungos”.

O poeta mauaense Moysés Amaro Dalva, no poema “Super Star”, incluído na antologia “10 Poetas em Busca de um Leitor”, publicada pelo Colégio Brasileiro de Poetas, em 1977, diz o seguinte: “Ficaram belas tuas mãos; No entanto / A bênção esperada como dantes /, Não pousam mais em tuas mãos cirurgiadas; / E o pão que partes nos salões gran-finos. / O pão que partes já não multiplicas; / Como na lenda do Deserto outrora; / Nem os peixinhos que de-baldes-agora; / Esmiuças nos faustos dos banquetes; / Guardam aquele sabor de alimento abençoado”. O poeta baiano, Pacífico Ribeiro, no belo livro “Sonetos Remanescentes”, publicou estes versos de incontida beleza: “Num pé de manacá, Judith ouvia/ uma pobre cigarra penitente, / cantando tanto, estridulamente,/ nas tardes mornas quando o sol morria”. O francês Louis Aragon no livro “Les Yeus d’Elsa” (Os Olhos de Elza) diz assim: “Outrora os cavalos iam devagar”. O poeta gaúcho, Oliveira Silveira, em “Banzo Saudade Negra”, diz: “Sobre a terra / que o preto lavrador / abandonou / comido por corvos / jaz o boi / morto e preto”. “Na minha terra, no bulir do mato. / A juriti suspira” – disse o nosso melancólico Casimiro de Abreu, nas suas “As Primaveras”. “As aves aquáticas foram para o poleiro mais cedo / os cavalos dispararam nas pradarias do espaço” – Aristides Theodoro, do livro “Poeminha Sem Realismo Para Ruth”. Milton, no “Paraíso Perdido”, assim escreveu: “O Leviatã, aquático gigante, / A maior das viventes criaturas: / Quando dorme, assemelha um promontório; / Quando nada, parece ilha boiando". "Nesse tempo, após o Advento, / pelo Natal, morta a estação, / Quando os lobos vivem de vento”. – São versos do francês François Villon, que nasceu em Paris em 1431, mesmo ano em que Joana d’Arc foi incinerada pelos britânicos. Villon viveu uma vida desregrada e promíscua, chegando mesmo a roubar e a ferir pra viver. Tendo mais tarde desaparecido de Paris, quando teve prisão decretada.

Fomos buscar estes versos em “Porto Inseguro”, do poeta Rossine Camargo Guarnieri: “O mar levou a vida que era um sopro / e os peixes comeram a carne”. Rodrigues de Abreu no “A Sala dos Passos Perdidos”, escreveu: “Tem o destino bom das borboletas, / das flores, das cigarras, dos poetas.../ Cantam numa ternura comovida”.

CAPITULO VII - “O BODE EXPIATÓRIO”

O inglês Charles Darwin no livro famoso “A Origem das Espécies”, teorizou: “Seria inútil separar os melhores touros e cruzá-los com as melhores vacas se a sua prole fosse deixada livre para acasalar-se com indivíduos de outros rebanhos”. A inglesa Ana Sewell intitulou o seu livro de “Azabache” (Autobiografia de um Cavalo). O romancista, Inácio de Loyola Brandão escreveu, no início de seu “Não Verás País Nenhum”, “os animais morrem”. O cearense Adolfo Caminha, autor de “A Normalista”, assim se expressou: “Nem um ruído na rua do Trilho, nem uma voz, nem um vôo pesado de um morcego: tudo silêncio, e uns restos de luar a extinguir-se esbatendo defronte nos telhados”. A romancista cearense Heloneida Studart publicou uma novelota valente que se chama “O Pardal é um Pássaro Azul”. O necrófilo poeta mineiro, Conde Belamorte, autor de três livros, decantando a morte e seus mistérios macabros, assim disse em “A Dança dos Espectros”: “Rodopiam fantasmas no meu cérebro! / Quando se me esvair a última essência. / Os necrófagos vermes que me espreitam. / Não terão abundância de matéria. / No macabro festim”. O paraibano Virginius da Gama e Melo (morto prematuramente), na ótima novela “Tempo de Vingança”, escreveu: “Os patos e os gansos, brancos, todos brancos e barulhentos, estavam descendo, pela estrada, para o açude. O cachorro espiava de longe. A mãe, a longa saia rodada, estava jogando milho para as galinhas, a urupema carregada. Os guinés esvoaçavam, caíam exatamente sobre os montes de aves mais compactos, onde mais caíra o milho”. O baiano Clóvis Amorim, em “O Alambique”, romance vivamente louvado por Jorge Amado, falou: “O cavalo de Bertoso galopava pelas estradas”. O norte-americano O. Henry, no seu conto “Natal no Rancho”, assim descreve uma cena: “...os convidados não conseguiram alcançar o assassino, que montara a cavalo muito antes dos vingadores do pobre vaqueiro”. O português Almeida Garrett, na novelota “Joaninha dos Olhos Verdes”, assim transmitiu o seu fascínio pela natureza: “Estava eu nestas meditações, começou um rouxinol a mais linda e desgarrada cantiga”.

O cubano Alejo Carpentier abre “O Reino Deste Mundo” desta forma: “Ti Noel escolheu sem vacilação aquele reprodutor grandalhão, de garupa redonda, bom para remontar as éguas que estavam parindo potros cada vez menores”. Ray Bradbury, na sua mais conhecida novela “Fahrenheit 451, disse: “O cão deu um passo, saindo do canil”. O ensaísta gaúcho Augusto Meyer escreveu dois ensaios com nomes de bichos no seu “A Forma Secreta” e “O Leão Morto e o Cão e o Rouxinol”. Tem um livro de Clarice Lispector (póstumo), que recebeu o título de “A Besta e a Fera”. O paraense Benedito Monteiro, no inovador “O Minossauro”, argumentou, com seu estilo abundoso: “Outros assim mordidos pela jaquiranabóia tinham morrido em cima do rastro. Ninguém, a não ser eu, ainda vivia escapado pra contar lambança. Veneno de Jaquiranabóia diz “que não tem cura”. O cubano lendário, Lezama Lima, no barroquíssimo “Paradiso”, no meio de uma das suas intermináveis dissertações, obtemperou: “Um ginete de besta negra levou a espada à face de um estudante que se atordoou e veio a cair debaixo do cavalo”. O poeta mauaense, J. Ramos, escreveu uma peça teatral que se chama “O Bode Expiatório”. O pernambucano Marcus Acioly tem estes versos grafados em “Nordestinado”: “A onça suçuarana / Que voa na fumaça / Do tiro errado nela”. De 1836 a 1841 o naturalista inglês George Gardner, viajando pelo Nordeste do Brasil, escreveu este trecho:... “viajando no nordeste do Brasil onde reina grande calor, sempre se dá descanso aos animais no meio do dia”. Outro naturalista, desta vez o alemão Carl Friedrich von Matius, que nos visitou entre 1817 e 1820, deixou estas frases nas impressões de viagem – “...um cidadão da Bahia, em uma viagem de mar para o Maranhão, havia naufragado e tinha visto a sua mulher afundar nas ondas, e a filha ser engolida por um tubarão”. O velho escritor cearense, Gustavo Barroso, no “Terra de Sol” (que está clamando por nova edição), fez estas colocações: “O cangaceiro, às vezes, veste de couro: perneiras estreitas, justas na perna, com uma ponta abotoada no bico longo da chinela; guarda-peito de couro de gato selvagem, de mourisco ou de onça sarapintada de negro em fundo amarelo e berrante”. A escritora inglesa, Elizabeth Goudge, no “A Estrela de Belém”, fez esta bela descrição: “Davi ia muito satisfeito sobre o camelo, e sua alegria fez com que se pusesse a tocar a sua flauta. Quando chegaram a Belém, seguindo sempre a estrela, os camelos se encaminharam para o bairro pobre da cidade".

O polonês Wladyslaw Stanislav no livro “Uma Lenda de Natal”, ironizou: “Os homens são ignorantes, e é por isso que são maus. É natural que os macacos se roubem uns aos outros, mas os homens devem auxiliar-se entre si”. O rio-grandense do norte, Umberto Peregrino, em “Desencontros”, registra no conto Pedro Cobra, este diálogo: -“Bestidade”, “João Jerônimo. Eu pego onça há dezenove anos. Estou prático nos ofícios. Nunca uma pintada fez mais do que me arranhar as mãos. Hoje em dia só não faço mesmo entrar nas furnas delas. Mas no campo enfrento qualquer uma sem sobrosso. Jogo areia nos olhos dela e ataco com os meus garfos”. O francês Frèdéric Mistral, Prêmio Nobel de 1904, no livro “Miréia”, nos ofereceu estes versos: “Grilos calaram nas noites/Mais de uma vez para escutá-lo; / Também os rouxinóis e pássaros noturnos”. O baiano Artur Salles, no poema Verão Morto, descreve: “Canta a cigarra. É o canto derradeiro, / triste, ferindo o céu crepuscular”. Utilizamos aqui a bela descrição do conto “A Volta dos Magos”, do ficcionista americano Manuel Komroff, que argumentou: “Os criados e os camelos dos Magos esperavam-nos nos poços. Rapazes e moças rondavam por ali, espantados com os curiosos tapetes das selas e com os ornamentos orientais dos arreios dos camelos ajoelhados”.

O conhecido romancista cearense, José de Alencar, abre o “Iracema” com estas palavras: “Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaubeira”. O satírico filósofo francês, Voltaire (1694-1778), no seu “Dicionário Filosófico”, escreveu o que se segue: “olha os pardais do teu jardim; contempla os teus pombos; repara no touro que levam para junto da bezerra, nesse ativo garanhão que dois palafreneiros conduzem ao pé da meiga égua que o espera e desenrola a cauda para o receber; vê como os seus olhos brilham; ouve os seus relinchos; contempla aqueles saltos, aqueles caracoleios todos, as orelhas espetadas, a boca que se abre em breves convulsões, as narinas arfantes, dilatadas, a respiração ofegante, as crinas erguidas que padanam, o imperioso movimento, com que ele se lança à conquista do objeto que a natureza lhe destinou”.

E assim, terminamos este capítulo com os belos versos de Drumond de Andrade: “Um cachorro vai devagar. / Um burro vai devagar. / Devagar...as janelas olham. / Eta vida besta, meu Deus”. Mais adiante, no mesmo poema “Fuga”, o poeta itabirano tem uns versos assim: “A vaia amarela dos papagaios/rompe o silêncio da despedida”.

CAPITULO VIII - “O PEIXE-BOI”

“E disse Deus: Produza as águas enxames de seres viventes, e voem as aves acima da terra, no firmamento do céu. Assim Deus criou as grandes criaturas do mar, e todos os seres viventes que se arrastam, os quais povoaram as águas, conforme as suas espécies, e todas as aves que voam, conforme a sua espécie”. Gênesis – da Bíblia. Caio Prado Júnior, na História Econômica do Brasil, descreve o que se segue: “o gado chega naturalmente estropiado a seu destino. A carne que produz, além de pouca, é de má qualidade”. O mineiro Murilo Mendes, no “Mundo Enigma” (1942), escreveu assim, no Poema Barroco, no seu linguajar hermético: “Os cavalos da aurora derrubando pianos avançam furiosamente pelas portas da noite”. Nas Obras Completas do crítico Agrippino Grieco, aquele que se riu à bandeira despregada da imbecilidade dos homens, se encontra um título com nome de animais: “Gralhas &Pavões”. O baiano Wilson Lins, no livro “Responso das Almas”, em certo ponto de um diálogo, fez um velho tabaréu dizer estas palavras: - “Era uma cobra enorme, do tamanho de um vapor, e que tinha quatro asas, cada qual de dois metros de comprimento”. O inventivo poeta cearense, Pedro Henrique Saraiva Leão, carrega bicho até no nome. O melancólico Luís Nicolau Fagundes Varela, em “Ave Maria”, escreveu esta quadra de beleza rara: “A noite desce, lenta e triste / Cobrem as sombras a serrania, / Calam-se as aves, choram os ventos, / Dizem os gênios: Ave Maria!” Outro poeta, o mineiro inconfidente, Silva Alvarenga, escreveu: “Quando puro se derrama / Vivo ardor no ameno prado, / Pelas brechas foge o gado / Verde rama a procurar”.

O paulista Paulo Prado, no volume seis, das suas Memórias, intitulado “Ofício de Trevas”, em uma legenda onde mostra os animais de sua estimação, diz: “A família zoológica era grande: quatro gatos, três cães, uma jaguatirica, um caititu, um ganso, dois jabutis e cerca de sessenta sapos. Toda comunidade, vivendo absolutamente unida e solidária...” O maranhense acadêmico, Josué Montello, publicou a novela “Antes que os Pássaros Acordem”. O português Miguel Torga, no Diário de 14 de setembro de 1975, ditou: “O Barroso coberto de gado. Os animais, diversos bichos a granel nos mesmos pastos, nos mesmos eitos, nos mesmos currais. Bois e galinhas no mais cordial convívio”. O inglês Percy Shelley (1795-1822) narrou no livro “Ave Viúva Pousada” o que se segue: “Ave viúva pousada / Chorando por seu amado / Sobre um ramo relegado”. O Prêmio Nobel alemão, Paul Heyse, escreveu em 1879 a “Salamandra”. O escritor moçambicano, Luiz Bernardo Honwana, intitulou um livro de “Nós Matamos o Cão Tinhoso. Luandino Vieira, português radicado na África negra, escreveu assim: “Os pardais jásaltam, pardal não sabe andar, apanhar as jingunas de encher os papos”. Eugénia Neto, novelista africana, editou “... E nas Florestas os Bichos Falam”. Outro africano, Maja Mwangi, produziu um romance intitulado “Carcaça Para Cães”.

O escritor português Júlio Dantas (1816-1962) escreveu em 1920 “Abelhas Douradas”. Outro português, Gomes Francisco Amorim, que viveu no Brasil, onde se alfabetizou, editou “O Fígado de Tigres”; João José Graves fez vir à tona “Noite de Cães”. Helder Herberto de Oliveira publicou em Lisboa, em 1997, o romance “Cobra”. Vitorino Nemésio batizou seu livro de “O Cavalo Encantado”. Oliveira Soares publicou em 1970 crônicas intituladas “As Andorinhas Não Tem Restaurante”. O Sueco Carl Spitteler tem um livro intitulado “Borboletas”. “O Pintarouxo” é título de um conto de Selma Lagerlof. O grande contista paraense Ingles de Souza (1853-1918), que pode ser incluído, sem favor algum, entre os maiores contistas deste país, em todos os tempos, narrou o que se segue, no conto regionalista Acauã: “Desde as sete horas da tarde, só se ouve na povoação o pio agourento do murucututu ou o lúgubre uivar de algum cão vagabundo, apostando queixume com as águas múrmuras do rio”. E mais adiante, no mesmo conto, o imenso narrador nortista ainda diz: “Aquela voz era a voz da cobra grande, da coloçal surucuriju, que reside no fundo dos rios e dos lagos. Eram os lamentos do monstro em laboroso parto”. Dalton Trevisan intitulou um dos seus livros de “Cemitério de Elefante”. Já houve quem dissesse, se referindo ao escritor B. Traven, que ele foi “um daqueles gênios esquecidos da literatura americana do século XX”. Esse sublime narrador, diz assim, no livro “O Visitante e Outras Histórias”: “Pássaros silvestres perseguiam as abelhas todo o tempo, apanhando-as quando elas entravam nas colméias ou delas saiam”. O irônico François Rabelais, um dos risos mais mordazes em todos os tempos, intitulou um dos pequenos capítulos de “O Gargântua”. “De Como Gargântua foi enviado a Paris na grande égua que desfiou as Moscas Bovinas. O primeiro capítulo de “O Meu Nome é Aram”, de William Saroyan, chama-se “O Varão do Maravilhoso Cavalo Branco”. A norte-americana Daphine do Maurier, que já foi muito lida e badalada no passado, assim se expressou em “A Estalagem Maldita”: “O que mais tinha sentido fora a morte da velha jumenta que as servira durante vinte anos e sobre cujas costelas largas e vigorosas Mary pela primeira vez esticou suas perninhas de menina”.

O filósofo Rodolfo O. Konder abre a sua novela sombria, “Comando das Trevas”, dizendo: “Os ágeis cavalos prateados sobem pelo flanco menos violento da serra, acompanhados de uns poucos homens desfigurados pela noite”. Luís Henrique Dias Tavares, autor de História da Bahia, diz no seu compêndio: “Os mais primitivos engenhos de moagem da Bahia eram de dois cilindros ou moendas horizontais, justapostas, geralmente, de madeiras, movidas a água ou por juntas de bois”. Edmundo Muniz em “A Guerra Social de Canudos”, descreveu: “Todos os moradores de Canudos trabalhavam, homens e mulheres, cuidando da plantação, do gado e fabricação artesanal dos utensílios mais necessários”. Theodoro Sampaio, engenheiro, que foi também grande escritor, no livro indispensável a todo brasileiro interessado em melhor conhecer o seu país, “O Tupi na Geografia Nacional”, traduzindo nomes de alguns pássaros da nossa fauna para o português do Brasil, disse: “Chipiú” Ave Frigilla, que é o nosso tico-tico. Churis A ema, uma das denominações que esta ave tem no guarani, Mato Grosso, Paraguai; Curicas, o papagaio todo verde”.

CAPITULO IX - “CAVALOS MARINHOS”

O catarinense Helmut Wiesse abre o seu livro, Novo Manual de Apicultura, assim: “As abelhas existem em nosso planeta a milhares de anos antes do homem, surgindo junto com as primeiras plantas e insetos”. O paranaense Eurico Branco Ribeiro, na sua “Água da Esperança”, diz o seguinte: “Até que seria poético o seu fim, entre o trinado dos pássaros, o bulício das folhas e o canto da cascata”. Fomos ao pensamento seguinte, na abertura do livro “O Tesouro de Siloé”, da escritora inglêsa, Mary Evans: “Os cães dos pastores latiam, furiosamente ao desaparecerem aqueles tipos estranhos nos outeiros escuros contra a luz do sol”. James Leo Herlihy no seu livro “Perdidos na Noite”, em um diálogo, colocou estas frases na boca do seu personagem: “Apresse-se, Baby – disse ela com viva irritação, dirigindo-se ao cachorro. – Faça o seu servicinho, faça, por amor da mamãe. Vamos, faça o seu cocozinho”. J. J. Van Tschudi, viajante suíço, que esteve no Brasil em 1857 e permaneceu dois anos entre nós, estudando a nossa flora e fauna, escreveu o que se segue, no livro “Viagem às Províncias do Rio de Janeiro e São Paulo”: “No dia seguinte, comprei uma boa mula de sela, aluguei as bestas de carga que eram necessárias”. O grande romancista baiano, Adonias Filho , no romance “Corpo Vivo”, descreve uma cena que inicia assim: “Rodeei a casa, em busca dos animais, nos fundos. Sabendo que a cangalha e os panacus estavam na barcaça diante dos cochos”. O dinamarquês Prêmio Nobel de Literatura de 1994, Johannes V. Jansen, escreveu uma novela intitulada “Metamorfose dos Animais”. O russo Ivan Bunn, em 1931, publicou um romance intitulado “À Sombra do Pássaro”. O renomado poeta italiano, Giosuè Carducci, escreveu estes três versos de incontida beleza: “Viu-o avançar com haste, / E como águia do Olimpo ou pomba do Ato? Entre os raios do céu, punhos armados”. O poeta sueco Erik Axel Karlfeldt, Prêmio Nobel de 1931, é autor destes versos: “A serpente se arrasta sobre o ventre e só come terra”.

O inglês John Galsworthy publicou uma novela da saga dos Forsytes, intitulada “O Macaco Branco”. O poeta grego, Giorgios Seferis, produziu um livro intitulado “O Tordo” (Gênero de pássaro da família dos turdidas, de plumagem de fundo branco-sujo. Com manchas escuras” - Dicionário Aurélio). O frânces Anatole France escreveu “L‘Ile des Pingoins”( A Ilha dos Pinguins). “O Rastro do Gavião” é uma peça do escritor norte-americano, Sinclair Lewis, de 1915. O romancista católico, François Mauriac, que deu um Prêmio Nobel ao seu país de origem, a França, em 1952, publicou um romance intitulado “O Sagüi”. O inglês Aldous Huxley criou uma alegoria intitulada “Os Cisnes Morrem”. Iyall Watson batizou o seu livro de “O Macaco Unívoro”. A famosa Madame Delly, que preenchera momentos de leitura inesquecíveis de nossas mães e avós, denominou uma de suas novelotas de “A Casa dos Rouxinóis”. O sertanista Agenor de Oliveira Freitas, no livro “Ouro e Paixão nos Rios Amazônicos”, diz o seguinte: “Sentindo-se preso pela poderosa mão do índio, percebendo haver perdido o traiçoeiro golpe, a serpente mudou de tática. Enroscou-se toda para tolher e dominar pretensa vítima nos seus elásticos anéis”. O romeno Zaharia Stanco, no livro “Um Pedaço de Terra”, diz: “Outros bebem de tal forma que acabam lançando seus gorros aos cães”. O novelista peruano, Jorge W. Abalos, no seu livro “Shunko”, diz assim: “As cabras não parecem ressentir-se da escassez do pasto, e vão suportando a má época”. Jerônimo Monteiro, no romance “O Ouro de Manoa”, assim se expressou: “Os Homens e animais, estes depois de aliviados das suas cargas, deixaram-se cair à sombra de vários monstros vegetais e ficaram por muito tempo em delicioso repouso”.

O paulista Léo Vaz no seu livro “O Misterioso Caso de Ritinha”, assim pronunciou: “De regresso, à noitinha , ao passo da Marreca , enquanto na baixada os vaga-lumes , à beira do caminho, piscavam na grama”. O romancista norte-americano Waschington Irving escrevendo “O Cavaleiro Sem Cabeça”, ditou: “O único sequaz doméstico de Ripe era Wolf, seu cão, também tão oprimido quanto o dono”. A riograndense-do-sul, Heloisa A. Nascimento, abre o seu livro “O Manuscrito” assim: “Um bando de gaivotas levantou da crista das ondas aos gritos dos rudes homens do mar”. “No instante de um relâmpago vemos um cachorro, uma carruagem, uma casa, pela primeira vez” – frases de J. Cocteua, citadas por Clément Rosset em “Anti Natureza”. O famoso escritor paulista, Malba Tahan, no seu livro de contos, Minha Vida Querida , diz assim: “... montei a cavalo e fugi, a galope, daquele exaltado muçulmano!” O belga Maurice Maeterlinck escreveu “O Pássaro Azul” e ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1911. O inglês Bernard Shaw publicou, em 1916, “Androcles e o Leão” e recebeu o Prêmio Nobel de Literatura, em 1925. O romancista Antonio Callado, no livro “Retrato de Portinari”, falando sobre a mãe do pintor de Brodowski, escreveu assim: “Era uma mulher fabulosa. Parecia um condottiere. Saía no seu carrinho puxado por um cavalo preto e nas saias tinha bolsos de um metro de comprimento, cheios de níqueis e de balas para as crianças”. O folclorista e historiador Edison Carneiro, no seu livro “A Conquista da Amazônia”, escreveu o que se segue: “O boi é sempre “a menina dos olhos”, “o animal de estimação” do amo, do vaqueiro e dos seus comparsas, “o lindo boi” que recorda uma fase econômica anterior à corrida da borracha”. O antropólogo Artur Ramos, no “As Culturas Negras no Novo Mundo”, descrevendo os rituais negros, assim se expressou: “O sacrifício de animais – galos, carneiros, etc. – exige um cerimonial completo”. O folclorista baiano Hildegardes Viana , no seu livro “A Cozinha Baiana – Seu Folclore – Suas Receitas”, ensinando fazer prato de abóbora com carne, disse assim: “Cozinha-se a carne de peito de vaca como se fosse para guizado. Adiciona-se abóbora cortada em pedaços mais ou menos graúdos. Deixa-se engrossar o caldo. Come-se com farinha ou arroz”(Delícia!).

O poeta Irineu Volpato, na sua linguagem vigorosa e até de certo ponto inovadora, diz no seu “Paulistarum Terra Mater”, o que se segue: “Aqui eram matas todinhas vadias / vadios os espaços / dum povo vadio / perdidos em verde campos. / Uns rios de peixes / as aves nos galhos”. O imenso romancista cearense, José Alcides Pinto, autor de mais de 50 romances, acaba de lançar a sua “Trilogia da Maldição”, pela Topbooks / Universidade de Mogi das Cruzes, contendo os seguintes romances: O Dragão”, “Os Verdes Abutres da Colina” e “João Pinto de Maria – Biografia de um Louco”, diz assim, finalizando um deslumbrante capítulo de “O Dragão”: “A mata era como um cemitério / As árvores caíam, mal se lhes tocavam. No chão, cadáveres de gaviões mortos. As penas ainda incrustradas no corpo cinzento”.

CAPITULO X - "TREZENTAS ONÇAS”

O filósofo inglês Bertrand Russel diz o seguinte em “O Casamento e a Moral”, referindo-se à impureza do corpo dos católicos do tempo de Santa Paula: “Os piolhos eram chamados pérolas de Deus, e andar coberto deles era marca indispensável de santo varão”. O gaucho Simões Lopes Neto intitulou um conto de “Trezentas Onças”. Henrik Sienkiewicz, escritor polonês, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1905, fez com que um personagem afirmasse o que se segue, no seu mundialmente conhecido “Quo Vadis?”: “Casarás Vitélio com o Nilo, para que dessa União nasçam hipopótamos: dará a Tigelino o deserto onde ele será o rei dos chacais...” Nehem Adas, na sua “Geografia da América”, vociferou: “A Inglaterra, ao contrário de Portugal e Espanha, não possuía escassez de mão-de-obra. Apresentava uma excedente população, em várias áreas de seu território, da agricultura pela criação de ovelhas com a finalidade de abastecer a indústria têxtil”. O velho Conan Doyle, em “O Círculo Vermelho e Outras Aventuras de Sherlock Holmes”, escreveu: “O Cão reflete a vida da família. Quem já viu um cão espevitado numa família sorumbática, ou um cão tristonho numa família jovial? Gente rabujenta tem cães rosnadores, gente perigosa tem cães perigosos”. O historiador baiano, Luíz Viana Filho, no seu nutrido livro “O Negro na Bahia”, disse: “Também na criação de gado não prosperou o trabalho do negro escravo. O fato é fácil de explicar. Assentava principalmente, em regiões de ordem econômica. A criação, não suportava as despesas exigidas dos donos das extensas sesmarias”. O escritor Guilherme Figueiredo, no livro “Comidas, Meu Santo”, intitulou um capítulo de “Cobras e lagartos”. “Não há dúvida de que existe um cheiro corporal característico de cada indivíduo. Embora a maioria de nós não esteja conscientes dele na maior parte das vezes, sua presença pode ser facilmente demonstrada pela facilidade com que um cão é capaz de seguir um rastro”: esta falação se encontra no livro “As Diferenças Raciais”, do professor Otta Klineberg, da Universidade de Columbia. Thales de Azevedo, no clássico “Povoamento da Cidade do Salvador”, assim verbaliza: “A praga da formiga é a mais antiga e tenaz inimiga da lavoura no Brasil. Mal chegara à Bahia, Nóbrega já mandava contar na Europa as devastações que faziam as formigas”.

O mineiro Aires da Mata Machado Filho, no livro, “O Negro e o Garimpo em Minas Gerais”, falando do totemismo dos negros, assim descreve: “Os Bananeca” têm uma cerimônia especial, por ocasião das colheitas, quando prestam um verdadeiro culto a um boi a quem chamam de Geroa”. O escritor gaúcho, Josué Guimarães, intitulou um de seus livros de “O Gato no Escuro”. O pintor e escritor Carybé, nas “As Sete Portas da Bahia”, assim falou: “Os bois, pacíficos e sonâmbulos, guiados como por encanto por uma liturgia de aboio, responsos de despedida chegam entre ladridos dos cães aos currais que circundam o sombrio edifício do matadouro”. O ex-presidente José Sarney batizou um de seus livros de “Marimbondo de Fogo”. Otto Lara Resende no seu bem estruturado “As Pompas do Mundo” assim descreve a ambiência rural mineira: “E passava pelos gordos tempos da lavoura farta a perder de vista. De toda a bem nutrida criação: novilhas, reses, muares, marroazes, sedosos cavalos de sela e tropa”. Pedro Nava intitulou uma de suas memórias de “Galo das Trevas”. A escritora carioca, Patrícia Bens, intitulou um livro de contos, de “Assassinato dos Pombos”. Leiamos o que disse o sarcástico Aggripino Grieco, no seu “Machado de Assis”, onde nem sempre é simpático ao romancista do Cosme Velho: - “Quanto à pilhéria que lhe atribui Leôncio Correia, dizem a um garçom: a propósito da mosca na sopa, gosto de mosca... mas ... separadamente”. O romancista Stephen Gilbert, na novela macabra, “Vingança Diabólica”, com sua obsessão por ratos, diz assim: “Depois de algum tempo, todos os ratos de cauda peluda tinham sido alimentados”.

O poeta inglês, John Keats, assim se expressou no poema “La Belle Dame Sans Merci”: “Que te pode doer, pobre diabo / Só em desalento vagando; / Os cíperos vêm secos desde o lago / E nenhum pássaro cantando”. O poeta H. W. Longfellow tem um verso assim: “É o gemido das Raposas e Corvos, ou o poderoso Bocemote”. “Um cão da família Montecchio bole-me os nervos” – disse Shakespeare em “Romeu e Julieta”. O angolano poeta Agostinho Neto escreveu estes versos, no seu livro famoso “Sagrada Esperança”: “ A vida a ti devo / À mesma dedicação ao mesmo amor / com que me salvaste do abraço / da jibóia”.

Oswaldo Orico, no auge da polêmica com R. Magalhães Júnior, que havia publicado “Rui o Homem e o Mito”, uma diatribe infernal contra o águia de Haia. Fez vir à luz do dia, “Um piolho na asa da Águia”, que, diga-se de passagem, não possui a argumentação da obra do autor de “Canção Dentro do Pão”.

Botando um ponto final nesta série de considerações sobre bichos na literatura mundial, onde consultei dezenas de livros e autores do mundo todo, e que provocou alguns comentários, uns contra, outros a favor, quando foram publicados em capítulos na “Voz de Mauá”, chamamos alguns dos maiores dicionaristas do país, a fim de darem os seus pareceres valiosos sobre a palavra bicho e seus derivados. Vejamos o que nos diz o Novo Dicionário Aurélio: “Bicho. (do lat. Bestiu.) S.M.I. Qualquer dos animais terrestres.6. Bibliol, Qualquer inseto bibliófago.Brasi.Pop. Designação comum a alguns tipos de insetos, como o cupim, a traça e outros, que introduzindo-se na madeira, nos tecidos, no papel, nas frutas, nos cereais, etc”. O Dicionário de Verbos e Regimes de Francisco Fernandes, conjugando o verbo Bichar, assim procedeu: “Bichar Intransitivo-Encher-se de bichos: “O feijão bichou todo. Bicharam as frutas”. O Dicionário Mor da Língua Português, com supervisão do professor Cândido de Oliveira, falando da “bicharada”, diz: “bicharada,s.f.- Grande quantidade de bichos”. O Dicionário da Língua Portuguêsa de Cândido de Figueiredo, falando de bichento, assim se expressa: “Bichento, adj.Bras. Quem tem bichos nos pés. Cambaio: “o diabo do macaco bichento, em vez de me acompanhar, pôs-se com dengues”. – Coelho Neto, Sertão, O Dicionário Etymológico, Prosódico e Orthográphico da Língua Portugueza por J.T.da Silva Bastos – Lisboa, (1928), diz: “Bicharia (xa-ri), s.f.multidão de bichos; (pop.) poviléu; (fam.) piolho. (De bicho).

“OS BICHOS NA LITERATURA MUNDIAL” POR IRACEMA M. RÉGIS

“OS BICHOS NA LITERATURA MUNDIAL”
Iracema M. Régis (*)

Os Bichos na Literatura Mundial”-, de autoria do jornalista e crítico literário, Aristides Theodoro. Sem modéstia à parte fui a primeira leitora a sentir a beleza, a enxergar o inusitado, o amplo trabalho de pesquisa e pôr que não dizer: o banho de erudição e informações, que vieram, quais sementes transportadas pelo vento, nas patas desses Bichos do Sr. Aristides Theodoro.

O segundo leitor, que acredito ter visto tudo isso e talvez mais, incentivado o autor a tornar pública essa coleção de bichinhos, foi , nada mais, nada menos, do que o poeta e crítico literário, Dimas Macedo – Bacharel e Mestre em Direito, Professor da Faculdade de Direito da UFC e Procurador do Estado do Ceará, dono de uma respeitadíssima obra literária, da qual destacamos: “Ossos do Ofício”/1992, “Leitura e Conjuntura”/1995, “Tempo e Antítese”/1997, “A Obra Literária de José Alcides Pinto”/2001 ( crítica literária) e “Estrela de Pedra”/1994, “Liturgia do Caos”/1996, “A Distância de Todas as Coisas”/2001-3a ed. (poemas).

De tanto ler, revisar e acompanhar os escritos de Aristides Theodoro, o que não serve de motivos para tecer elogios ou encontrar qualidades infundadas, posso no mínimo constatar e afirmar que ele chegou a uma maneira própria, gostosa e bem particular, de dizer as coisas . Se assim não fosse “Os Bichos na Literatura Mundial”, pôr tratar-se de um tema único e capítulo repetitivos, a sua leitura poderia tornar-se chata e cansativa. O que não acontece, pôr vários motivos: no decorrer da leitura vai aparecendo, sobrepondo-se, uma série de citações, títulos, frases e versos lapidares, que nos enriquecem, nos enchem a alma e nos levam às lágrimas, como estes versos do imenso baiano Castro Alves – “A juriti do taquaral no ramo, povoa soluçando a solidão”.

Por outro lado, as inúmeras citações feitas, pôr um sem número de escritores, nos remetem à pureza, à singeleza dos animais, à sua fiel amizade ao bicho homem; é palpável o caráter de humanismo emprestado pela Literatura aos bichos, tratando-os como gente, colocando como personagens centrais, quando menos, como figura de destaque nas suas estórias.

Em determinado momento do livro uma citação fala da semelhança entre o animal e o seu dono – por exemplo, gente nervosa e agressiva cria bichos agressivos; pessoas dóceis possuem animais dóceis. Então, eu que não sou dada a cães e gatos, lembrei-me de que uma vez perdi-me de amor pela cachorrinha Liuba (que em russo quer dizer querida): ela é a figura do dono – comportada, discreta, muito na sua, observadora, prestativa e ao mesmo tempo receptiva, quando acarinhada.

Poderia continuar mostrando mais aspectos positivos dessa obra, mas como tudo tem dois lados, houve também quem não gostasse – segundo o autor a pessoa expressou-se da seguinte forma:

- “Aristides, você saiu da estaca zero, para chegar a lugar nenhum”. Respeito o gosto, mas considero tal leitor mais animalesco do que todos esses Bichos reunidos aqui em dez capítulos, que sorvo com imenso prazer, pôr me passarem uma grande lição de humanidade.

(*) Iracema M. Régis

(Escritora e resenhista literária)

DADOS BIOGRÁFICOS

Aristides Theodoro nasceu em Utinga – Bahia, em 27 / 11 / 37. Milita na imprensa há vários anos. Participou em mais de uma dezena de antologias literárias em prosa e verso. É resenhista literário e publicou os seguintes livros: Dandaluanda (poesia), 1982; O Poeta Passeia Por São Paulo num Sábado à Tarde, 1991; Poeminha Sem Realismo Para Ruth, 1993; Não Contribuirei Com um só Óbolo para a Construção do Novo Mundo, 2002; Como Preparar Um Diabo Velho em Forno Brando, 1993 (ensaios Literários) em parceria com Iracema M. Régis e Estórias de Curiapeba (contos regionalistas). Escreve e publica um Diário no Jornal a Voz de Mauá, desde 1999. Tem inéditos “Novas Estórias de Curiapeba” e “Manifestações Literárias em Mauá – O Colégio Brasileiro de Poetas, Seus Fundadores, Sócios e Outros Escritores da Cidade”.


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