sexta-feira, 16 de novembro de 2007

APRESENTAÇÃO

Em memória de Don‘Ana, minha mãe, sua docilidade e bondade de boa analfabeta.

Para Cosme Theodoro, meu pai, homem culto, que me contou tantas estórias de assombrações, cangaceiros, secas medonhas, almas penadas, botijões de ouro, mulas-sem-cabeça e onça “montó”.

Ainda para meus irmãos: Adelina, Sigismundo, Juvenal, Otocar e Jacinta.

* * *

Copyright © 2002 by Aristides Theodoro


Digitação e projeto gráfico:

Francisco Tânio de Oliveira


Revisão:

Judith Vilas Boas Ribeiro


Prefácio:

Dimas Macedo

Foto da Última Capa:

Odete Thomaz da Silva

Posfácio: Iracema M. Régis

* * *

Quando li seu livro, ocorreu-me o mesmo fato que você descreve no início: Um desfile de insetos e mamíferos povoou minha memória de leitora. Creio que a experiência se repetirá com tantos outros leitores. Portanto, você conseguiu seu intento. Valeu a pena!

Judith Vilas Boas Ribeiro

* * *

Disse também Deus: Povoem-se as águas de enxames de seres viventes; e voem as aves sobre a terra, sobe o firmamento dos céus.

Criou, pois, Deus os grandes animais marinhos e todos os seres viventes que rastejam, os quais povoavam as águas, segundo as suas espécies; e todas as aves, segundo as suas espécies. E viu Deus que isso era bom. E Deus os abençoou, dizendo: Sede fecundos,

multiplicai-vos e enchei as águas dos mares, e, na terra, se multipliquem as aves.

Primeiro livro de Moisés - Gênesis, 1 versículos 20 e 22

PREFÁCIO

A permanência da obra literária e o ponto de vista da crítica centram-se no poder de imaginação que a leitura provoca. É, assim, a estética da recepção o braço armado com que a escritura postula suas investidas e os seus mais dourados arremessos.

A descoberta tardia ou o revigoramento de um escritor de talento dependem, na maioria dos casos, dos olhares subseqüentes com que certas obras são examinadas. Não é a escritura, tão-somente, aquilo que empresta leveza à obra de arte literária. Mas é a argúcia do crítico, com acerto, o elemento que ilumina a claridade do texto e o recorte estético que, às vezes, lhe é correlato.

Os Bichos na Literatura Mundial (Mauá/SP, Edições Jahde, 2002), de autoria de Aristides Theodoro, constitui um esforço inequívoco de quem sabe sondar a arte literária e os seus mais intricados labirintos, pela ótica da lucidez e da erudição.

Não se trata de livro didático, que se preste talvez à retórica das Universidades, ou ao displante vazio dos melhores chás acadêmicos. Trata-se de um esboço, apenas, de uma trajetória cultural entre livros, feita, às vezes, de forma quase apaixonada, porém sempre pela ótica de um leitor contumaz e muito atencioso.

E se reafirmo a dimensão cultural e humana deste livro de Aristides Theodoro, é porque sei que os bichos e os seus engenhos nada mais são do que a projeção dos recessos da alma e das suas formas mais silenciosas.

Se Buda falou ao espírito das árvores e reencarnou a sua seiva viva e palpitante, e se Francisco de Assis, com sua sutileza de santo e de poeta, conseguiu a audiência dos peixes e dos pássaros, é porque esses reinos pertencem igualmente ao homem e são indiscutivelmente a sua completude.

As pradarias e os mais belos cavalos do mundo, o corvo impertinente de Poe, o galo de ouro de Rachel de Queiroz, a vaca de nariz sutil de Campos de Carvalho, a baleia misteriosa de Herman Melville, Guimarães Rosa e o seu poético burrinho pedrês e a origem, também, das espécies e de toda a fauna imaginária e real dos grandes escritores estão neste livro de Aristides Theodoro a nos desafiar.

Mergulhar na sua leitura é sorver a literatura universal nas suas fontes mais originais. É, antes de tudo, enriquecer os velhos moinhos da memória. É desfrutar, por igual, o labirinto do Jardim do Éden, e o zoológico da imaginação do encanto, antes que a cegueira se faça à negação de todas as belezas.

Fortaleza, 23 de Outubro de 2001
Dimas Macedo

CAPITULO I - "MOBY DICK”

É de admirar a grande quantidade de animais que povoam a literatura do mundo todo. Não digo só a grande literatura, mas sim, a literatura em geral.

Sou um daqueles homens que não sei pensar em dinheiro (vício do homem moderno), mulheres, de maneira desabonadora, etc. Só sei pensar em artes, livros, autores, enredos e por aí afora. Dia desses, no meio da noite, acordei com a cabeça cheia de bichos da literatura, que, mesmo me marcando profundamente, quando os vi pela primeira vez, por ocasião da leitura dos seus livros, muitos foram por mim esquecidos e nessa referida noite, como num conciliábulo animalesco, se reuniram para me perseguirem e não me deixaram em paz, enquanto não voei da cama e comecei a falar deles e de seus criadores.

Duvido muito que o mais frio e calculista dos viventes, nascido de mulher, não se impressione vivamente com a fúria selvagem, os gritos e a força descomunal de Moby Dick, a imensa, a desmedida baleia branca, tão bem descrita por Herman Melville. Nesse livro, aprendemos tudo sobre o soberbo cetáceo, tudo sobre a tormenta dos mares-oceanos e tudo sobre a estupidez humana. Duvido de que o vivente leia “Moby Dick” e não saia dele totalmente lambuzado de alga, salsugem e queimado pelos sóis, ventos e gelosidades dos mares. Quando a gente sai desse livro, tem a sensação de ouvir, sempre ao longe, os silvos imensos da baleia ferida; carregando na cacunda os ganchos infernais do arpão assassino do Capitão Acab.

O nosso mineiríssimo João Guimarães Rosa fala sempre de bichos em suas obras, e poucos deles nos marcam tanto a sensibilidade, como a cascavel do conto “Bicho Mau”, de “Estas Estórias” e o “Burrinho Pedrês”, de “Sagarana”, ambos, movimentantes, nas páginas do grande narrador.

Tolstói, com maestria, descreve no seu “Os Cossacos” a presença constante do urso pardo nos campos gelados do Cáucaso, sempre perseguindo os cortiços de abelhas dos campônios montanheses. É por demais conhecido de todos o grasnido infernal e enjoativo do corvo de Edgar Allan Poe, que diz sempre a mesma frase monótona, empoleirado na cabeça de uma alva estátua de Minerva:

- “Nunca mais! Nunca mais!...”

O também norte-americano William Faulkner muito contribuiu com uma quantidade enorme de animais para a literatura. É inesquecível a constante presença de uma mula, no desenrolar de uma narrativa criminosa, contada na novela “O Mundo não perdoa”, ou o urso do livro “Desça, Moysés”.

Em um dos seus poemas, Jorge de Lima diz o seguinte: “O sagüim de Iaiá dorme num coco” e mais adiante, no mesmo poema “A Madorna de Iaiá”, o grande vate alagoano, ainda falando de bichos, assim se expressa: “Muito longe uma peitica faz Si-dó...Si-dó!...” Ascenso Ferreira, no seu estilo jocoso, deu sua contribuição no belo poema “Ascensão de São Pedro”: “Seu vigário! Está aqui uma galinha gorda, que eu trouxe pro mártir São Sebastião. Está falando com ele! Está falando com ele!” O romancista paraibano, José Lins do Rego, tem obsessão pelo canário da terra. Gilberto Freyre fez longas e belas descrições a respeito da cabra, do cavalo, do cão e da vaca. Euclides da Cunha muito elogiou a mula, no desempenho da selvagem guerra de Canudos. José Mauro de Vasconcelos descreve com beleza ímpar a formosura de alguns pássaros de nossa terra, em especial, os flamingos e jaburus. Mário Palmério, em “Vila dos Confins”, descreve uma caçada de onça, que se torna uma das partes mais interessantes para os leitores do romance. Cassiano Ricardo tinha predileção pelo jaguar das nossas matas. Castro Alves, além de outros animais, gostava também do jaguar e da juriti, a qual descreve em sentidos versos: “A juriti do taquaral no ramo, povoa soluçando a solidão”.

As novelas e contos de Ernest Hemingway estão saturadas de miúras, cavalos, trutas, perdizes, faisões, elefantes, alces, leões, patos selvagens, espadartes, tubarões e outros bichos. É sabida a fascinação de Jorge Luis Borges pelos tigres e Julio Cortázar pelos gatos. É por demais conhecido o conto do guatemalteco Miguel Ângel Astúrias, intitulado “Torutombo”, em que o velho Prêmio Nobel descreve como ninguém a fúria de um touro selvagem. No livro “Sangue e Areia”, do espanhol Vicente Blasco Ibañez cuida o tempo todo de touradas, bois, toureiros, cavalos e mulheres bonitas. O uruguaio Horácio Quiroga, no livro “Anaconda”, descreve o terrível das nossas selvas, cheias de mistérios, animais fantasmagóricos e todo tipo de assombrações criadas pelo imaginário popular. “A Divina Comédia”, de Dante, começa com uma loba e um leão. A cachorra Baleia, de “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, se tornou tão famosa como o seu criador e hoje corre mundo e uiva em diversas línguas do planeta.

O inseto estranho, de “A Metamorfose”, de Kafka, se tornou tão popular, que o povo se encarregou de transformá-lo em uma barata. O romancista baiano, Jorge Medauar, tem uma novela que se chama “A Procissão e os Porcos”. O velho folclorista pernambucano, Mário Souto Maior, em “Os Mistérios do Faz Mal”, apresenta uma lista enorme com os nomes dos animais que o Criador anunciou a Moisés, dizendo o que servia e o que não servia para a alimentação do povo de Deus. Lawrence da Arábia enfatiza sempre o valor do camelo nos seus “Os Pilares da Sabedoria”. O boi e o cavalo são sempre citados nos romances de Erico Verissimo. Dionélio Machado escreveu uma novela intitulada “Os Ratos”. A paulista Lígya Fagundes Telles, “O Seminário dos Ratos”. Em “A Peste”, do francês Albert Camus, os ratos invadem e passeiam livremente pelas ruas de uma cidade. Em uma das novelas menores de Balzac, é descrita a convivência amigável de um homem com um tigre, o mesmo acontecendo no conto “Meu Tio Iauaretê” do livro “Estas Estórias”, de Guimarães Rosa.

O grande Jorge Amado, no capítulo “A Mata”, do seu inconfundível “Terras do Sem Fim” (para mim o livro mais poético do autor), descreve uma infinidade de animais como as andorinhas, corujões, macacos, “cobras de inúmeras espécies que deslizavam entre as folhas secas, sem fazer ruídos, onças miavam seus espantosos miados nas noites de cio”. No mesmo capítulo, o Jorge Amado ainda cita o lobisomem, a caapora, a mula-de-padre, o boitatá, o lobo e tantos outros seres imaginários. O jornalista Nelson Rodrigues tinha obsessão pelas “cabras vadias”.

CAPITULO II - “OS PATOS”

O torturado poeta Gonçalves Dias, quando longe da pátria estremecida, escreveu estes versos doridos, que todo brasileiro sabe de cor: “Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá, as aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá”. “Desmamar bezerro não é nada, duro é desfilhar a mãe” – disse Chico Buarque de Holanda, em “A Fazenda Modelo”. O novelista Dias Gomes, no livro “Sucupira Ame-a ou Deixe”, sucesso de audiência no passado, diz o seguinte: “Negrinho do Jegue, embriagado, apoia-se no jumento para não cair”. “As aves de ouro vão nas árvores pousar, / Os meus peixes de ouro a mim irão voltar”, - disse o romancista inglês, católico, Chesterton em “O Homem de Duas Barbas”. É notório o magrém do cavalo Rocinante, da novela “Dom Quixote”, de Cervantes. “Quantos animais restam? Reuniu os restos do seu rebanho. Nessa noite abriu, com um par de alicates, o arame da pastagem. Suas ovelhas pastavam toda noite”. (Do livro “Bom Dia para os Defuntos”, do peruano Manuel Scorza). Vargas Llosa escreveu “La Ciudade y Los Perros”. O paraibano José Américo de Almeida intitulou um dos seus livros de “Reflexões de Uma Cabra”. O grande cearense, Pompílio Diniz, no seu “Poemas”, tem uns versos assim: “Eu tenho na minha casa/ Um papagaio faladô, / Bichinho de pena e asas,/ Num pode tê mais valô... Conversa cum´s animá/ E, adespois, vem me contá/ Tudo qui os bicho falô!” O valente Prêmio Nobel russo, Aleksandr Soljenitsin, para melhor denunciar os arbítrios do falido comunismo soviético, escreveu um belo livro intitulado “O Carvalho e o Bezerro”. Outro russo, Anton Tchekhov, escreveu uma história curta, que se chama “Camaleão”. O nosso monumental e tempestuoso Tobias Barreto de Menezes, assim começa o poema “Os Tabaréus”: “Ouve como um tropel,/ Que se aumenta, que se engrossa.../ A poucos passos da choça/ Nitriu fogoso corcel.” O velho poeta pernambucano, Solano Trindade, fez esta pergunta nos “Cantares a Meu Povo”: “Quem tá gemendo/ Negro ou carro de boi?”. O Prêmio Nobel indiano, de 1913, Rabindranath Tagore, no livro de título estranho, “Çaturanga” (escreve-se com ç mesmo), diz o seguinte: “Estaria disposto a fazer passar como caril de cabrito os pratos de aves”. O aristocrático poeta da Paulicéia, Guilherme de Almeida, no seu imenso poema “Raça”, diz: “Chimpanzés mecânicos, treparam na cruz com rezas, trejeitos e benzeduras”. O sarrista Juó Bananére, em “La Divina Increnca”, com seu italiano deturpado, assim escreveu: “Deitava sempre di notti,/ I alivantava cidigno/ Uguali d’um passarigno, Alegro i cuntento da vitta”. O russo rebelde, Maiakóvski, comenta no seu “Hino ao Juiz”: “Por um Peru-Paraíso clamam os peruanos/Onde havia mulheres, pássaros, danças”. O humorista russo, Arcádio Avertchenko, escreveu um conto intitulado “Uma Vaca”. Platero é o nome de um burrinho peludo, criado pelo espanhol Juan Ramón Jiménez, ganhador do Prêmio Nobel, em 1956.

Homens e Caranguejos” é título de um romance de Josué de Castro. “Tem uns camaradas que não acreditam em Deus; vão para o Jóquei, estudam o programa e passam a acreditar piamente nas patas de um cavalo”. – Stanislaw Ponte Preta em “Máximas Inéditas de Tia Zulmira”. O escritor catarinense Othon d’Eça é autor de um conto intitulado “O Pica-Pau”. O botânico francês, Auguste de Saint Hilaire, que viveu no Brasil, de 1816 a 1822, tem uma descrição que se chama “Em lombo de Burro”. O inglês Lafcadio Hearn escreveu um conto que se intitula “O Menino que Desenhava Gatos”. O gaúcho Moacyr Scliar novelou com “O Carnaval dos Animais”, em 1986. O romancista Marques Rebelo, no “A Mudança”, diz: “tenham a coragem de proceder à extirpação do berne, à cauterização da bicheira”. O extraordinário contista cearense, Juarez Barroso, (morto imaturamente), no livro genial, “Joaquinho Gato”, inclui um conto que se intitula “Cururu”. O contista piauiense, radicado em Santo André, Valdecirio Teles Veras, no bem urdido livro “Sabor Canjica e Outras Estripulias”, editado pela Alpharrabio, diz, narrando suas reminiscências sertanejas: “Saímos do curral e o carneiro, sem que necessitasse de corda, me acompanhou como se fosse meu velho conhecido, me seguindo como um cão fiel”. O cínico e desbocado poeta português, Manuel Maria du Bocage (1750-1795), em um dos sonetos, poetisa: “O corvo grasnador e o mocho feio, / O sapo berrador e a rã molesta / São meus únicos sócios, na floresta”. Domingos Carvalho da Silva, da Geração de 45, tem um livro que se intitula “A Presença do Condor”. O poeta mauaense, Aristides Castelo Hanssen, no sonoro “Canção Pro Sol Voltar”, publicado em1983, num dos momentos difíceis deste País, escreveu: “É noite, os gatos são pardos”.

A poeta e intelectual argentina, Margarita Anechina, no livro “Das Profundas Raízes”, escreveu: “Deixou-me um pássaro ferido...” Roque Luzzi, tão cedo roubado do nosso convívio, em “A Festa dos Meus Olhos”, no poema “Ter Asas e Voar”, exclamou “: Oh! Ter asas e voar, / voar, voar pela amplidão”. Oliveira Ribeiro Neto, no “Eu Canto a América”, apresenta-nos estes versos: “da moura Granada / nutrido das forças das cabras ciganas, / no pico dos Andes em busca dos índios / é como um índio, / mantido de erva e leite de lhama”. A poeta rebelde, Tônia Ferr, no livro “Massacre”, diz: “quero ser lobo em alcatéia / ou camundongo a me esconder”. Paulo Setúbal, num poema sertanejo, “Alma Cabocla”, escreveu: “no eito, / Vão desbastando os juás. / Eu venho tão satisfeito. / Como se houvesse em meu peito / - Um baile de tangarás!” Outro paulista, Menotti Del Picchia, começa o seu imenso “Juca Mulato”, assim: “Nuvens voam pelo ar como bando de garças”. O conhecidíssimo José Paulo Paes, um dos mais criteriosos tradutores do país, assim aparece em “A Poesia Está Morta Mas Juro Que Não Fui Eu”: “mais vale um pássaro na mão / que uma espingarda. / O poeta Oswaldo de Camargo, em “O Estranho”, tem um verso assim: “como ave / de volta ao seu ramo verde”.

O poeta Henrique Cunha Jr., nos “Cadernos Negros 20, colaborou com um conto intitulado “O Olho Azul do Cachorro”. O satírico Cláudio Feldman escrevendo “Cais do Caos”, colocou: “Desvenda / A centopéia”. O romancista Antonio Possidonio Sampaio, no seu mais recente livro, “Andanças na Contramão”, argumenta: “Ali pardais, chupins, tico-ticos e rolinhas convivem pacificamente ao lado de carros e advogados apressados”. Alexandre Takara diz nas suas reminiscências filosóficas, “O Semeador de Lembranças”: “A natureza desperta, as folhas das árvores farfalham ao sopro do vento. O galo canta, o boi muge, o vaqueiro toca o berrante, os pássaros ruflam suas asas. Conheço-os pelo canto”. A panfletária americana, Harriet Beecher Stowe, autora do famoso “A Cabana do Pai Tomás”, (livro que levou Lincoln a dizer: “Ele (o livro), mais do que os generais cooperaram para a vitória das forças do Norte”), - disse assim: “Na água, límpida como cristal, nadavam milhares de peixinhos, de variadas cores, brilhando como tantas outras pedras preciosas. O verborrágico Coelho Neto, num dos contos de “Sertão”, começa dizendo: “o gado mugia, extenuado e magro, levantando para o céu fulvo os grandes olhos mansos e resignados”. O escritor e musicólogo andreense, Wagner Calmon, na crônica “Porta Sem Trinco Baú sem Tranca”, rememorando o tempo de menino do interior, diz: “vi um vaga-lume no quintal”

CAPITULO III - “A VACA DE NARIZ SUTIL”

A romancista cearense Rachel de Queiroz tem dois livros com nomes de bichos: “O Caçador de Tatu” e “O Galo de Ouro”. “Ninho de Cobra” é título de uma novela de Ledo Ivo, que começa com uma raposa invadindo a cidade. José Cândido de Carvalho criou o seu “O Coronel e o Lobisomem”, que hoje correm mundo em noites de lua cheia. Chico Anysio escreveu “O Batizado da Vaca”. Julieta Godoy Moreira é autora de “Entre Lobos e Cão”. Marisa Raja Gabaglia criou o seu “Milho para Galinha, Mariquinha”; o pernambucaníssimo Luís Jardim escreveu uma novelota infanto-juvenil, que se chama “O Boi Aruá”. Lima Barreto, um dos escritores necessário a este país, descreve de maneira magistral, no seu “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, um feroz ataque de formigas a um pomar. “Três Alqueires e uma Vaca” é título de um livro do escritor católico, Gustavo Corção. A velha cronista paraense, Eneida, publicou em 1955, pela José Olympio Editora, o seu “O Cão da Madrugada”. O romancista Osório Alves Castro, barranqueiro do São Francisco, intitulou o seu segundo livro com o sugestivo nome de “Maria Fecha a Porta Prau Boi Não te Pegar”. “Carcará” é nome de uma novela do potiguar Ivan Bichara. O grande Monteiro Lobato, esse homem imenso, que fez as crianças do Brasil se interessarem por livros, intitulou uma de suas obras de “Picapau Amarelo”. O goiano Campos de Carvalho escreveu “A Vaca de Nariz Sutil”, Francisco Marinho, da Academia Paulista de Letras, criou várias histórias com nomes de bichos: “O Coleira Preta”, “Gafanhotos em Taquara-Póca e “Bugre-do-Chapéu de Anta”.

São por demais conhecidos os belos versos de Manuel Bandeira, em que os batráquios dialogam na lagoa: - “Urra o sapo boi! – Meu pai foi rei” – Foi! – Não foi” / Foi – Não Foi!”

O alemão Günter Grass, Prêmio Nobel de Literatura de 1999, escreveu “A Ratazana” e o “Linguado”. O polêmico D. H. Lawrence publicou o “Pavão Branco” e “A Serpente Emplumada”. Machado de Assis, no seu estilo trôpego, monótono, repetitivo, abre o “Memórias Póstumas de Brás Cubas” com a seguinte frase: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver”. De Mário de Andrade é “Empalhador de Passarinho” e o “O Peru de Natal”. Paulo Dantas, esse velho escritor “nordestinado”, muito contribuiu para o povoamento do zoológico literário, com “O Sertão do Boi Santo” e “De Repente o Mar”, neste o, personagem central é uma baleia. O grande mexicano Carlos Fuentes intitulou uma novela de “A Cabeça da Hidra”; o nosso pernambucano Hermilo Borba Filho, autor de um estilo seguro, incisivo, criou “O Cavalo da Noite”. A Editora Paz e Terra publicou, em 1978, a novela do peruano Ciro Alegria, que tem o belo título em castelhano, de “Los Perros Hambrientos” (Cães Famintos). “Três Tristes Tigres” é o clássico do dissidente cubano, Cabrera Infante. Severo Sardui foi outro cubano, que também botou uma “Cobra” no zoológico literário. O inconfundível Juan Rulfo, no “O Planalto em Chamas”, publicou um conto intitulado “Não está Ouvindo os Cachorros Latirem?”. O escritor dominicano, Juan Bosch, no seu “Maravilha”, escreveu: “calmo, lúgubre, experimentado em sofrimento, ia caminhando lentamente o velho boi negro”. O argentino Ricardo Güiraldes, no seu fascinante “Dom Segundo Sombra”, cita com assiduidade cavalos, cães, vacas, quero-queros e “um galo cantou; alvorecia impetuosamente”. “Entardecia quando a cavalgada chegou” – disse o equatoriano Jorge Icasa, em seu valoroso romance social, “Huasipungo”. O nosso Visconde de Taunay, no soberbo “A Retirada da Laguna” (com nova edição na praça), fala o tempo todo em bois e cavalos. Aníbal Machado assinou um conto que se intitula “Ratos, o Guarda-Civil e o Transatlântico”. A Edições Melhoramentos, na Coleção Prisma, publicou “Os Animais em Perigo”, do norte-americano John Sparks. “Bichos que falam” é título de um infanto-juvenil de Viriato Correia. O casal de escritores norte-americanos, Barbara “BJ” Hateley e Warren H. Schmidt, escreveram um livro sobre negócios, com o título de “Um Pavão na Terra dos Pingüins”. O vate paulista Rolando Roque da Silva, em “O Poeta e Circunstância”, diz o seguinte: - “é chegado o tempo em que as ovelhas, / retribuindo os golpes e os ápodos / estão, nos quatro cantos do Universo, / arreganhando os dentes para os lobos”. Antonio Lapate Netto, poeta e educador competente, em Santo André, em “Alhos com Bugalhos”, cita vários animais como o lobo, o bode, o leão, o grou, o elefante, a cigarra, a formiga, a mosca, a aranha, a raposa, o galo, a mula, o canguru, o pernilongo, entre outros.

O velho poeta piauiense, Da Costa e Silva, um dos grandes trovadores deste país, infelizmente esquecido, no seu poema mais conhecido, “Saudade”, do livro “Poesias Completas”, assim diz: “Saudade! O Parnaíba – velho monge. As barbas brancas alongando... E, ao longe, / o mugido dos bois da minha terra”. A parisiense Anaïs Nin, que provocou paixões desesperadas no tarado Henry Miller, escreveu um belo livro, com o título de “Pequenos Pássaros”.

Em 1973, um grupo de rapazes e moças sonhadores, no meio dos quais se encontrava este que vos fala, fundou o Colégio Brasileiro de Poetas, em Mauá (SP) e ao publicarem a segunda antologia poética do grupo, deram-lhe o nome de “Revoada de Pássaros Negros”. O romancista americano, Scott Fitzgerald, no “Seis Contos da Era do Jazz”, tem um trabalho intitulado “As Costas do Camelo”. John Steinbeck criou “Ratos e Homens” e “O Menino e o Alazão”. Jack London, em boa parte dos seus livros, tem animais como personagens, tais como “O Filho do Lobo”, “O Lobo do Mar”, “As Tartarugas da Tesman”, etc. O Prêmio Nobel, García Márquez, enriqueceu a literatura mundial com “Olhos de Cão Azul”; o chileno José Donoso nos presenteou com um livro intitulado “O Obscuro Pássaro da Noite”. Walt Whitman, o velho gato angorá norte-americano, assim descreve no seu “As Folhas da Relva” “o rapazola carpindo milho, o liteireiro guiando seus seis / cavalos no meio da multidão”. O nosso importantíssimo Raul Bopp, que escreveu “Cobra Norato” e tem quem diga que é “Cobra no Rato”, começa o imenso poema assim: “faço puçanga de flor de tajá de lagoa / e mando chamar a Cobra Norato”.

O contista catarinense, Enéas Athanázio, em um de seus livros, descreve um velho cavalo (Rosilho Velho) com tanta perfeição e sentimento, que provoca choro no leitor.

CAPITULO IV - “O CORVO”

O filósofo francês Jean-Paul Sartre intitulou uma de suas peças de “As Moscas”; o recifense Frederico Pernambucano de Mello, no “A Guerra Total de Canudos”, diz o seguinte, referindo-se à alimentação do homem do Nordeste do país: “Como o mocó, o punaré ou o preá, fregueses dos serrotes de pedra, abria-se sempre uma fonte adicional de proteína para os residentes mais escopeteiros, do lado das rolinhas, da lambu, da codorna e das aves de arribação”. Mais adiante, no mesmo capítulo, o grande ensaísta ainda diz: “As forças armadas rendem-se ao segredo alimentar dos jagunços, cangaceiros, matadores de onça, amansadores de burro brabo, tropeiros e de quantos desenvolvem ainda hoje atividades intensas nos sertões do Nordeste”. Yolanda Földes escreveu “A Rua do Gato que Pesca”; o americano Horace McCoy publicou “Os Cavalos Também se Abatem”; Jean Carrière deleitou seus leitores com “O Gavião Louco”; A.S. Györgi escreveu “O Macaco Louco”; “Tropas e Boiadas” é título do clássico do goiano Hugo de Carvalho; Henry Miller escreveu estas frases duras, no seu “Sexus”, primeiro volume da famosa trilogia “A Crucificação Encarnada”: “As moças estão exalando vapor, como cavalos suarentos”. Dostoievski, em um dos seus livros mais pungentes, “Humilhados e Ofendidos”, conta-nos uma estória patética, onde aparecem um velho miserável e o seu sarnento e repugnante cão Azor. Leiamos este fragmento: “Após haver permanecido três ou quatro horas sentado, o velho, por fim, levantava-se, pegava o chapéu e ia para casa. O cão levantava-se, também, e, de cauda entre as pernas e a cabeça baixa, seguia-o maquinalmente com seus passos lentos.”

De Víbora na Mão” é título de um livro do romancista Hervé Bazim. É por demais conhecido aqui no Brasil, “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell; “O Planeta dos Macacos”, de Pierre Boule, também foi muito lido entre nós. O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche, filosofou assim, a respeito do homem, no “O Antecristo”: “No nosso conceito (o homem) é o mais forte, porque é o mais astuto: a sua espiritualidade é uma conseqüência disso. Por outro lado, defende-nos contra uma vaidade que aqui também queria levantar a voz: como se o homem tivesse sido o grande pensamento último da evolução animal. Não é de modo algum a coroa da criação; cada ser encontra-se junto a ele no mesmo grau de perfeição”; mais adiante, o irado pensador germânico diz de maneira afirmativa: “o homem é, relativamente, o mais deficiente dos animais”. Os versos que se seguem encontram-se no “Primeiro Caderno do Aluno de Poesia Oswald de Andrade”: “A sua habilidade consistia em matar de longe / Decepando com uma longa e certeira faca / Cabeças de frangos, patos, marrecos, perus / enfim / Da galinhada solta no quintal”. A norte americana Alaide Malkus escreveu “A Potranca Cor de Ouro”; o padre Vieira, nosso contemporâneo nordestino, batizou o seu livro de “O Jumento Nosso Irmão”. A contista Iracema M. Régis, no trabalho intitulado “Sonhos Imortais”, inserido em “Cadernos Negros 20, diz o seguinte: “Se Deus me ajudar, volto para minha terra, ainda volto. Vendo tudo isso aqui e vou terminar meus dias ouvindo a juriti e o sabiá”.

“Os cavalos caminhavam de pescoço caído, em silêncio”, - disse o francês André Malraux em “A estrada Real”. “Deitado no peitoril da janela, o cachorro olhava a noite na praça”, de Marina Colassanti, no livro de nome estranho, “Zooilógico”. “Yo soy Toro em mi Rodeo”, de José Hernandez, em “Martín Fierro”; Pierre Louÿs assim se expressou no “O Amor de Bilitis”: “supondo que eu tivesse sido picado por um escorpião”. Emily Dickinson disse assim no seu “Uma Centena de Poemas”: O “pedigree” do mel / Não interessa à abelha”; o conhecido escritor cearense, Domingos Olímpio, em “Luzia Homem”, assim se expressou: “A pousada predileta de bandos de urubus-tinga e camirangas vorazes”. “Milkaus cavalgava molemente o cansado cavalo” em “Canaã” de Graça Aranha. “As Abelhas Farmacêuticas com Asas” é título de um livro de N.P. Ioirich. “A minha onça não era uma onça qualquer. Era uma pretona, malhada de prata, de olhos verdes, brilhantes como uma lanterna”. – “Maíra” – Darcy Ribeiro. “O gado vinha procurar água, ali embaixo tinha uma lagoa” – Antonio Torres em “Essa Terra”. O poeta paulista, Jacob Netto no livro “Palmeiras do Meu Deserto”, tem um verso assim: “No roseiral florido um colibri, / num beijo ardente cada flor abarca”. “O Conde e o Passarinho” é título do livro de crônica de Rubem Braga. O norueguês Henrik Ibsen intitulou uma de suas mais famosas peças de “O Pato Selvagem”; o pernambucano Mário Sette, no livro “Arruar – História Pitoresca do Recife”, tem um capítulo que se chama “Vai sair um Passarinho”; o poeta inglês, T.S.Eliot, em um dos seus inspirados versos disse assim: “Agora os rouxinóis cantando estão”. “Não fui ver a baleia que estava a bem dizer à porta de minha casa a morrer”, diz Clarice Lispector em “Visão do Esplendor”; o famoso James Joyce, autor de Ulisses, abre o “Retrato do Artista Quando Jovem”, assim: “Certa vez – e que linda vez que isso foi! -, vinha uma vaquinha pela estrada abaixo, fazendo muu!” “A Borboleta de Dinard” é título de um livro do Prêmio Nobel italiano, Eugenio Montale; o americano Nathanael West intitulou seu livro de “O Dia do Gafanhoto”.

O Queijo e os Vermes” dá título ao livro do historiador italiano, Guinsburg; o romancista Kurt Vonnegut Jr, disse o seguinte, no livro “Revolução do Futuro”: “A gata arqueou suas costas e unhou o terno de Paul novamente”. O nosso Amir Klink, em “Cem Dias Entre Céu e Mar”, descreve esta cena: “Um enorme tubarão lentamente se esfregava no casco, com a galha para fora da água, e com a cauda, a cada passada dava um tope na proa”. O russo rebelde Yevgeny Yevtushenko disse assim no poema “Feira em Simbirsk”: “Tudo escuro em redor... A polícia secreta pula como esquilo”. “Certa vez, uma turma de policiais com cães sabujos examinou esta floresta” – isto está no livro “Um Homem Jovem”, do escritor alemão Botho Strauss. Marcello Vérité e Romains Semon escreveram um infanto-juvenil que se chama “Banto: O Pequeno Elefante”. “Os cachorros mudaram, afinal; e quando imaginávamos que nós tínhamos de haver com uma raposa, eis que ela se transforma em texugo” – Fielding em “Tom Jones”. “Os coelhos, pobrezinhos. Havia muitos coelhos na Ilha: Brancos, cinzentos, pretos, malhados. Mas, quem mandou os coelhos procriarem tanto?” Assim o romancista Herberto Sales abre o seu romance “O Fruto do Vosso Ventre”. A Rede Globo de Televisão, novelizou “O Sorriso do Lagarto”, do baiano acadêmico, João Ubaldo Ribeiro. Todo o país ainda assovia ou gunguna, comovido, os versos bonitos de Catulo da Paixão Cearense. Dia desses, a Iracema e eu fomos jantar num restaurante do Largo do Arouche, e pudemos notar como a dupla de cantores Radiante e Fábio Luiz conseguiram despertar vivo interesse dos comensais presentes, quando abriram o peitão no mundo, cantando os versos sentidos de “O Luar do Sertão”, onde estão estas estrofes que vou transcrever na íntegra: “Ser enterrado / numa grota pequenina, onde, à tarde, / a sururina / chora a sua viuvez!” Não resisto aos encantos da poesia desse grande maranhense e transcrevo mais alguns versos de incontida beleza, do mesmo “O Luar do Sertão”. Vamos lá: “Enquanto a onça, / lá na verde capoeira, / leva uma hora/inteira, vendo a lua, / a meditar!” Fomos garimpar os versos que se seguem, no “O Tocador de Atabaque”, de Eduardo Alves da Costa: “Tropas de burro, / com seus tropeiros”. O sombrio Augusto dos Anjos, tido como o poeta cientificista do Brasil, também dá aqui a sua contribuição para o enriquecimento deste zoológico animalesco: “Que importa a mim que a bicharada roa / Todo o meu coração, depois da morte?” José Duro, poeta português, é um trovador da mesma família dos Augustos dos Anjos e autor de um livro trágico, penumbroso, chamado simplesmente “Fel”, que destila versos assim: “Quando o Coveiro, um dia, arremessar, sombrio, / O teu corpo gentil aos vermes resolutos, / De lá, da esfera azul dos astros impolutos, / Verás então, Mulher, verás como eu me rio”. O teatrólogo Luigi Pirandello, ganhador do Prêmio Nobel em 1934, intitulou alguns de seus livros com nomes de animais. Vejamos: “A Mosca”, “O Corvo de Mizarro” e “Um Cavalo na Lua”.

CAPITULO V - “ARARA VERMELHA”

O escritor Ronald de Carvalho, no livro exemplar, “Itinerário”, falando da sua visita ao México, assim escreveu, tomado de deslumbramento: “onde as árvores não brotam, não corre água, nem se emplumam aves, está o mexicano, com sua coragem, a sua resignação e o seu heroísmo espontâneo”. O carioca Gastão Cruls batizou dois contos, um “Coivara”, de “O Caçador de Pacas” e o outro de “História Puxa História”, de “A Patativa”. O mundialmente famoso Vladimir Nabokov, na novela, “Lolita”, descreve este período: “Cresci, criança saudável e feliz, num mundo brilhante de livros ilustrados, areias claras, laranjeiras, cães amigos, paisagens marinhas e rostos sorridentes”. Francisco Julião, esse pernambucano misto de escritor e agitador político, escreveu assim, em “Irmão Juazeiro”: “O defeito dela era ser estéril. O maior defeito que u’a mulher podia ter. Como vaca maninha. E por falar em vaca, quando o filho nascesse, ferrava – ferrava-lhe um garrote”. O poeta sergipano, Afonso Vicente Ferreira, no soberbo livro “Arpejos Póeticos”, escreveu: “Com unhas e dentes, um cão rói um osso”. O escritor Eduardo de Oliveira, em “Angústia do Tempo Presente”, que está no livro “Banzo”, assim se expressou: “O leite é artigo de luxo / que só o rico põe no buxo, / e dá pros gatos, e pros cães”. Bruna Lombardi intitulou um dos seus poemas de “O Dragão”, de “Ilha das Cobras”. O vigoroso contista, teatrólogo e poeta Cuti, pseudônimo de Luís Silva, em “Batuque de Tocaia”, cunhou estes versos incisivos: “Eu vou ao mar para colher os ossos / e pedir aos tubarões que devolvam a lembrança / dura dos seus banquetes". O gaúcho Vargas Neto batizou um livro de “Gado Xucro”. Boris Pasternak abre o “Dr. Jivago” assim: “Seguia, seguia sempre e, quando cessava o canto fúnebre, julgava-se ouvir, como a continuá-lo, cantarem as pernas, os cavalos e o sopro do vento”. O catarinense Alcides Buss, no seu “Transação”, inseriu os poemas “Todos os Pássaros” e “Beleza e Camarões”. Colhemos a descrição seguinte no livro “História Social da Economia Capitalista no Brasil”, do sociólogo Oliveira Viana, citando Saint Hilaire: “Umas baixas casinhas, quase sempre de palhoça eram a habitação de senhores de 20 ou 30 léguas de belas terras e que colhiam 10 a 20.000 bezerros”. O português Fernando Pessoa escreveu o famoso poema “O Guardador de Rebanhos”. Outro português, também melancólico, Antero de Quental, disse os versos seguintes: “A amazona, que se agarra às crinas / Dum corcel e combate satisfeita”. O poeta pernambucano, Deolindo Tavares, no seu “Poesia”, escreveu assim: ... “o Leão representa a besta, e a besta domina o mundo”. Camões se referindo ao avestruz, que dizem ter um intestino que devora tudo, assim se expressou no épico “Os Lusíadas”: “às aves no ventre o ferro gastam”.

C. G. Jung, nas memórias, assim descreve suas andanças pelas Áfricas negras: “Até o horizonte mais distante, percebemos imensas manadas: gazelas, antílopes, gnus, zebras, javalis, etc. Pastando e sacudindo as cabeças, as manadas se moviam lentamente - ouvia-se apenas o grito melancólico de uma ave de rapina. Havia o silêncio do eterno começo”. O poeta cearense Vanderley Pereira, em “Cantiga que Vem da Terra”, presenteia o leitor com estes belos versos: “O Cenário: a caatiga, um boi mestiço; / Um chocalho chorando, um pau quebrado; / Um cavalo cardão, sagaz; Um gibão sobre o toco, abandonado”. Outro poeta, desta vez o matuto Zépraxédi, do Rio Grande do Norte, em “Meu Siridó”, imprimiu versos como os que se seguem: “Tem a tristeza de rês / qui berra chêrando o chão / no lugar qui derramaro / o sangue dum seu irmão”. “A negra dançava sempre, circulava pela sala, derretida para os homens, roçando-se neles, num jeito de galinha contra o galo, no terreiro” – O escritor cearense Herman Lima assim escreveu no seu livro “Garimpo”. O contista baiano Luís Garboggiani Quaglia no conto “O Menino e o Peixe”, incluso em “Panorama do Conto Baiano”, disse: “o galo cantava na madrugada, a pomba gemia através do ar aveludado”. Outro baiano, Santos Moraes, publicou uma estória curta chamada “Caçador de Borboletas”. Georges Simenon intitulou dois dos seus policiais com nomes de bichos: “O Cão Amarelo” e o “Gato”. A carcaça de um veado, morto a vinte milhas, deu carne suficiente para encher uma torta de vasta circunferência. Um bacalhau de sessenta libras, pescado na baía, fora dissolvido no rico molho do “chowter” (peixe cozido com biscoito) – esta descrição-receita está no livro “A Casa das Sete Torres”, de Nathaniel Hawthorne. Até hoje ainda corre mundo, quase que de domínio público, a frase famosa do Barão de Itararé: “Quando pobre come frango, um dos dois está doente”. O poeta cearense Cruz Filho, no livro “Poemas dos Belos Dias”, tem um verso que diz o seguinte: “Aos pinchos, pela sombra, indolente e moroso, / O batráquio estacou no fundo do poço à borda”. Rudyard Kipling intitulou um de seus livros de “Jacala, O Crocodilo”.

R. L. Stevenson, no início do “A Ilha do Tesouro”, diz... “coisas esquisitas da Ilha da Tartaruga e outras regiões selvagens do continente espanhol”. Bernando Guimarães, no romance “A Escrava Isaura”, fez esta descrição: “Bois truculentos, e nédias novilhas deitadas pelo gramal, ruminavam tranquilamente à sombra de altos troncos da casa, balavam as ovelhas, e mugem as vacas”. James F. Cooper, no primeiro capítulo de “O Último dos Moicanos”, disse assim: Aceitaram a proteção do major Duncan Heyward, em belíssimos cavalos, iniciaram a caminhada”. “Se o encantado de sua vida é um pássaro maravilhoso que você ama carinhosamente, você alegremente o alimentará com as sementes do seu íntimo e fará do seu coração uma gaiola” – disse Kahilil Gibran Kahilil, no livro “Espirito Rebelde”.